De personagem a pano de fundo, a Rua Augusta foi o espaço escolhido para as divagações e questionamentos de Daniela Glamour Garcia, a protagonista, e Camila Biau, roteirista e diretora de “Além das 7 cores” (2012). Apresentando também Bruno Dalcheco e Erica Martins, o curta é a surpresa de cada papel desembrulhado daquele presente que está dentro das caixas gradualmente maiores. O presente somos nós e, as caixas, os paradigmas que nos ensinam a seguir, mas que devem ser quebrados.
“Alguns seres simplesmente têm uma incompatibilidade sexual com o corpo. Isso não é uma transformação. Isso é um fato. Aí, de repente, você se pega tendo que fazer da sua vida uma transformação inteira porque todo mundo quer que seja. Quem separou o mundo assim?”, indaga Glamour Garcia, na tentativa de levar o espectador à reflexão da real importância de seguir rótulos, a qual talvez seja nenhuma.
Definido por muitos como a representação da realidade, um documentário quer incomodar o espectador, tirá-lo da zona de conforto e fazê-lo pensar. Entretanto, como afirma Comolli (2008, p. 80), “longe de filmar a-realidade-tal-como-ela-se-dá, o cinema só pode apreendê-la como acumulação de relações” e, nesse processo, é fundamental que o espectador esteja ciente de que o personagem atua, o cineasta conduz, a câmera capta e o montador seleciona, e que dessas relações ainda sai uma interpretação diferente em cada subjetividade espectadora.
Os quase 20 minutos de “Além das 7 cores” questiona as regras e preconceitos impostos a cada particularidade sexual e abre um caminho para se pensar em mudanças no universo simbólico a que estamos inseridos. A narrativa é construída pelas opiniões dos três entrevistados, e segue uma ordem lógica a partir do que pretendeu os produtores do curta, principalmente depois das gravações. Nosso olhar está sendo atravessado pelas mise-en-scènes (interpretações) do cineasta, que não consegue filmar o que vê; do personagem filmado, que está representando diante da câmera; e do filme como um todo, que resulta das relações anteriores e passa por um processo crucial de edição.
Ao longo da construção narrativa, o espectador é levado a se questionar, por exemplo, sobre a necessidade de tantos padrões a serem seguidos. E sua enunciação mostra que não basta sair da caixinha pragmática “homem e mulher”. Temos que sair da caixinha das 7 cores (LGBT) que insiste, em algum momento, em voltar para os padrões “homem e mulher” para agradar visualmente a sociedade e se adequar aos novos embrulhos (mal)feitos de cada caixa.
Normas, limites, classes e categorias geram conflitos em quem decide viver à margem do “normal”, e que muitas vezes já têm que quebrar barreiras normativas uma, duas ou três vezes e, em todas elas, incorporar novas tendências pré-estabelecidas para cada novo fato. Para além das questões de diversidade sexual e de gênero, sair das amarras sociais que nos prendem aos estigmas que só interessam à vida de outra pessoa é o que nos convida o curta “Além das 7 cores”. É o que nos convida a protagonista Glamour Garcia, a roteirista Camila Biau, e as muitas cores misturadas de uma mesma minoria.
Assista ao documentário: http://curtadoc.tv/curta/comportamento/alem-das-7-cores/
Por Luma Perobeli
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