Observatório da Qualidade no Audiovisual

Análise Balenciaga

Por: Beatriz Rêgo, Inês Ponceano, Mariana Barbosa

A Balenciaga foi fundada em 1919 pelo espanhol Cristóbal Balenciaga, em San Sebastián. Em 1937, a marca se estabelece em Paris e começa uma trajetória composta por revolução e criatividade na moda, ganhando destaque pelos designs que remetiam à arquitetura, com formas estruturadas que não eram usuais na época. Em 1968, Cristóbal se aposenta e a marca se encontra em posição de “standby” no mercado. Nos anos 2000, Nicolas Ghesquière assume a direção criativa da Balenciaga, colocando-a novamente numa posição de destaque na moda.

No ano de 2015, a marca ganha um novo diretor criativo: Demna Gvasalia. Este oferece à marca outra renovação identitária, abrangendo designs urbanos, estética disruptiva e experimentos visuais. Estes aspetos atribuíram à Balenciaga um modelo de inovação, que a tornou um símbolo contemporâneo de referência na moda de luxo. A marca, no contexto atual, destaca-se pela habilidade de criar uma codificação estética constante e distinta, fator que reforça sua relevância simbólica e sua relação com o público.

Em termos semióticos, a Balenciaga construiu e reconstruiu constantemente sua imagem pública através de signos visuais e culturais que a conectam ao luxo, à inovação e à ousadia. Essa codificação foi impactada de forma notável no final de 2022, quando a marca lançou uma campanha controversa envolvendo crianças e simbolismos interpretados como referências inadequadas. A análise pública levou à acusação de sexualização infantil, amplificando a polêmica devido a posicionamentos anteriores da marca. 

Esse episódio provocou uma recodificação social significativa, prejudicando tanto as relações-públicas quanto o desempenho econômico da marca, em virtude da mudança da opinião pública. Luigi Torre, redator da revista Elle, afirma que: “Em algumas das fotos, crianças aparecem segurando ursinhos de pelúcias com looks bondage de couro, cercadas por outros produtos. Não demorou para acusarem – com razão – a etiqueta de sexualizar menores de idade.” “(RAMOS, 2023)

Mediante o contexto supracitado, é percetível o questionamento que acompanha o tema: Como a semiótica pode analisar a recodificação pública da marca antes e depois da polêmica de 2022? O objetivo geral do trabalho consiste na compreensão da recodificação popular referente a Balenciaga depois da polêmica de 2022, avaliando as mudanças executadas pela marca para se reerguer perante o público.

A Balenciaga

Balenciaga é uma marca de luxo espanhola, fundada em 1919, com posicionamento estético futurista e inovador. A marca foi criada pelo espanhol Cristóbal Balenciaga e desde então, se desenvolveu e estabeleceu no mercado, ocupando um grande espaço de relevância no mesmo. A partir da guerra civil espanhola, o mercado de moda no país entrou em declínio, e o fundador da marca foi submetido a condições que o obrigaram a deslocar sua empresa para Paris, em 1937, onde abriu uma casa de alta-costura.

A primeira coleção da grife a ter mais sucesso foi inspirada no Renascimento Espanhol. A partir desta, a marca inseriu o peplum no mundo da alta-costura. Em 1951, a Balenciaga começou a destacar-se em relação à concorrência: diferente da proposta relativa ao modelo imposto por Christian Dior o “New Look”, as silhuetas criadas pela Balenciaga proporcionavam conforto e liberdade para o corpo feminino.

Em 1972, Cristóbal Balenciaga encara o término da sua trajetória, e a marca é esquecida pelo público durante alguns anos. Entretanto, em 1997, a Balenciaga contrata Nicolas Ghesquiere que a coloca numa posição de prestígio novamente. A partir deste momento, a marca alcança sua época de mais sucesso.

Balenciaga sempre obteve destaque por sua habilidade de criar uma codificação estética sólida e distinta, fator que, consequentemente, colabora com a sua relação com os consumidores e a relevância simbólica da marca para o público. Nos desfiles de moda, era frequentemente a marca que fechava a apresentação, e a Vogue Magazine era a única revista permitida a fotografar os/as modelos, registos estes que só vinham a ser impressos com a autorização prévia da marca.

Entretanto, em 2001 a marca foi comprada pelo grupo Gucci e vem a aderir à moda de pronto vestir, cultura que seu criador não apoiava. Ao invés disso, defendia a elegância, exclusividade e qualidade das peças e tecidos. Em 2015, Gemma Gvasalia assume a direção criativa da marca no lugar de Alexander Wang.

No fim do ano de 2022, Balenciaga lança uma campanha, com crianças representando a nova coleção de grife. Após análise pública, a marca é acusada de sexualização infantil. Alguns posicionamentos anteriores e contraditórios da empresa fazem com que a situação se amplifique. A polêmica envolvendo a Balenciaga gerou um debate sobre os limites do mundo da moda e “arte” envolvida no marketing de cada empresa e a responsabilidade de cada marca. Dias após a polêmica, Gvasalia emitiu um comunicado desculpando-se ao público e a todos que se sentiram afetados:

“Quero me desculpar pessoalmente pela escolha artística errada do conceito para a campanha de presentes com as crianças e eu assumo minha responsabilidade. Não era apropriado ter crianças promovendo objetos que não tinham nada a ver com elas. Por mais que às vezes eu queira provocar uma reflexão através do meu trabalho, NUNCA teria a intenção de fazer isso com um assunto tão terrível como o abuso infantil, que eu condeno.” (EQUIPA BALENCIAGA, 2022).

Balenciaga vs. Christian Dior

 

Uma marca reconhecida, semelhança à Balenciaga, é a Dior. Comparando as duas campanhas acima, verificamos uma grande diferença entre as propostas. Podemos verificar que a campanha da Dior tem uma proposta mais encenada, sendo que os modelos têm expressões e poses que não são associados à naturalidade do dia a dia. Os tons usados nas fotografias remetem-nos a imagens mais antiquadas. Enquanto na campanha da Balenciaga, temos uma proposta mais “natural”. As modelos presentes na campanha não estão posando de uma maneira tão “forçada”, e seu andar remete-nos a uma movimentação mais natural.

Balenciaga vs. Chanel

Outra marca importante no mundo da moda é a Chanel, reconhecida pelo apelo à feminilidade. Em suas campanhas, usam peças que acentuam o corpo feminino, geralmente magro. A roupa usada na campanha da Balenciaga acaba por ter um aspeto mais confortável em comparação à roupa da Chanel. O cenário da campanha remete, ainda, a uma situação mais cotidiana: um café de rua. Com esta proposta de vestuário, pose e cenário mais natural, a marca pode ajudar a quebrar alguns estereótipos do mundo da moda.

Balenciaga vs. Balmain

Como podemos reparar na campanha da Balmain, os dois modelos presentes são figuras públicas: Kanye West e a Kim Kardashian. A luminosidade da fotografia é relativamente escura e o cenário intenso. A roupa utilizada pelos modelos tem linhas muito fortes e detalhes chamativos, como é o caso do padrão visível na blusa de Kanye e na gargantilha utilizada por Kim. O uso de figuras traz mais visibilidade à marca, visto que ambos têm uma base de fãs estruturada.

No caso da Balenciaga, a marca opta por um cenário mais minimalista e descontraído. Na maioria das vezes, a marca opta por modelos de alta-costura para apresentar as roupas. O uso de roupas “oversized” ajudam a desconstruir a ideia de que as roupas femininas precisam favorecer o corpo feminino. A maneira como estas marcas se comunicam com o seu público é diferente, apesar de serem duas marcas conceituadas no mundo da moda.

A Balenciaga como objeto de estudo é uma marca muito interessante, desde a sua criação que a marca foi evoluindo de acordo com aquilo que a sua audiência queria, tornando-a uma marca muito versátil e que não tem medo de correr riscos, com isto podemos afirmar que a marca sempre se vai destacar do lado da sua competição.

O impacto cultural e a gestão de crises da Balenciaga com a polêmica de 2022

Para entendermos o impacto que a polémica de 2022 teve culturalmente, temos de entender, primeiro, o posicionamento da Balenciaga e a forma como construiu a sua imagem nas redes sociais. Ao longo dos últimos anos, a imagem da marca de luxo e a mensagem que busca passar vem alterando-se. Nas campanhas de 2014 e 2015, o diretor criativo Alexander Wang tinha uma visão mais conservadora da alta-costura, demarcando a definição do feminino, do masculino e do luxuoso. Durante estes anos, o Instagram da marca era composto, em sua maioria, por acontecimentos como abertura de lojas, montagens de desfiles e as celebridades presentes neles.

Em 2015, Demna Gvasalia é nomeado diretor criativo da marca e cria polémicas, inspirando-se no mundo quotidiano. Segundo o artigo “Construção da marca Balenciaga nas redes sociais: Um estudo no Instagram”, de Michel Nepomuceno, a Balenciaga “promove uma espécie de esnobismo reverso, apela para a beleza não ortodoxa e desperta o desejo pelo feio”, criando coleções compostas por itens que, posteriormente, eram repugnados pelos consumidores, como pochetes, Crocs e sapatos ortopédicos. Nas campanhas dos anos que se seguiram, todo o glamour foi trocado pelo provocativo, feio e pela fluidez de género. Desde então a marca considera-se “destruidora dos padrões convencionais da indústria da moda” (Nepomuceno,2019). 

Uma das estratégias de comunicação da Balenciaga é gerar polémicas para obter um sentimento de incompreensão por parte do consumidor. Logo, a polémica da utilização de imagens de crianças com objetos que não são próprios para as suas idades não foi exceção. Isto gerou um sentimento de revolta no público, levando-o a condenar a campanha da marca com a criação de hashtags no Twitter e no TikTok, como #cancelbalenciaga, #boycottbalenciaga e #balenciagascandal. Questionaram, também, celebridades embaixadoras da marca sobre o seu posicionamento quanto a esta questão.

Em resposta às críticas dos consumidores e como tentativa de voltar a ganhar o seu respeito e confiança, o CEO da marca, Cedric Charbit, partilhou um comunicado no Instagram da Balenciaga, pedindo desculpa pelas ofensas que a campanha causou e assumindo a responsabilidade pela campanha. Diz, também, que a Balenciaga, enquanto marca, condena o abuso de crianças e revela a doação de uma grande quantia para associações de proteção de crianças, o que pode ser considerado uma estratégia para mostrar o “positive us” (Kharismi, A., 2024). Outra estratégia utilizada para apaziguar a polémica foi alegar que não tiveram controlo sobre os documentos que estavam no fundo das imagens. Distanciam-se da responsabilidade pelos documentos dizendo que os itens incluídos na sessão fotográfica foram cedidos por terceiros.

No comunicado partilhado, foram descritas algumas medidas que a empresa tomou devido a esta situação, tais como o reforço das estruturas do processo criativo e da validação do mesmo, a revisão da forma de trabalhar da empresa e a cooperação com organizações especializadas na proteção das crianças. Apesar do pedido de desculpas e da tentativa de remediação da Balenciaga, a sua imagem na visão do público foi permanentemente alterada. A seguir, analisadas, semioticamente, cinco campanhas da Balenciaga através da metodologia estabelecida por Barthes. Para melhor compreensão e resultado, serão analisadas duas campanhas antes da polêmica de 2022, a mesma, e duas depois.

Campanha Primavera 2018

Nesta campanha não foram utilizadas quaisquer frases ou palavras, excetuando o nome da marca em algumas imagens. Contudo, a interpretação destas imagens pode remeter-nos para o desejo ou para a falta de privacidade, assim como uma empatia para com os indivíduos que são constantemente submetidos a um escrutínio por parte da sociedade.

Para a campanha de primavera de 2018, a Balenciaga optou por utilizar paparazzi como fotógrafos. Deste modo, fotografaram modelos altamente conhecidas a saírem de locais específicos cobrindo a face com as bolsas da marca, proporcionando ao público um momento de privacidade requerida pelos famosos ao sair de locais privados.

Dentre os principais elementos visuais está a pessoa famosa a sair de um local com o seu segurança. A celebridade utiliza roupas e acessórios da coleção em análise, assim como uma mala para cobrir a cara e garantir a sua privacidade. As peças de roupa utilizadas apresentam uma mistura de padrões como riscas, xadrez e notas de dólares. O diretor criativo da marca, apostou em cores vibrantes e silhuetas oversized.

Em relação à estética geral, as peças desta coleção foram baseadas na valorização da moda do dia a dia e das peças mais banais, sendo que as fotografias foram tiradas em ambientes do quotidiano como a porta de várias lojas da Balenciaga. Este fator remete-nos para o facto de a marca ser famosa, logo os modelos utilizam peças da sua autoria.

Nesta campanha, a marca de luxo faz uma crítica à cultura pop, aos paparazzi e à sua adoração pelos famosos, o que pode ser visto nas poses utilizadas pelos modelos, assim como na utilização dos efeitos de luz para simular o flash das máquinas fotográficas dos paparazzi.

Para a construção do mito, a Balenciaga parece partir da mensagem de que todos podem utilizar as roupas e acessórios da sua coleção. Isso pode ser argumentado devido à utilização de cenários do quotidiano e de modelos apresentarem diferentes idades e looks mais relaxados. É sugerido, aos clientes da marca, que, com a utilização de artigos Balenciaga, são importantes e que o seu estilo será reconhecido em qualquer lado, tal como as celebridades. Transmitem também a ideia de que as peças têm de ser cuidadas e estimadas pela presença dos seguranças nas imagens.

A campanha foi partilhada através do Instagram, onde grande parte dos clientes e admiradores da marca estão presentes, o que pode fazer com que o número de partilhas e de vendas aumente substancialmente. A construção do mito acima referido tem o intuito de levar os amantes de moda a sentir a necessidade de comprar peças desta coleção, pois o storytelling da campanha remete-nos a um sentimento de valorização do consumidor, já que quem utiliza Balenciaga deve ser valorizado e reconhecido, tal como as celebridades.

A falta da utilização de frases ou palavras na campanha aumenta a sensação de privacidade tão procurada pelas celebridades, pois não nos é explicado nada em concreto acerca da coleção nas imagens. Possibilita também uma subjetividade no que toca à sua interpretação por parte do público-alvo.

Campanha primavera-verão 2019

Tal como na campanha do ano anterior, a Balenciaga optou por não utilizar frases nem palavras na campanha publicitária da sua coleção de primavera de 2019. A falta de elementos textuais, permite aos clientes da marca fazerem as suas próprias interpretações da mensagem transmitida pelas imagens. A coleção de primavera-verão de 2019, foi inspirada no filme Matrix, tendo sido assinada pelo realizador Jon Rafman. O mundo da distopia e da tecnologia foram essenciais na criação desta coleção. A marca, inclusive, até recriou algumas cenas no seu vídeo publicitário (Balenciaga Summer 19 Campaign)

Dentre os principais elementos visuais estão as imagens da campanha, que são fotografias num estúdio cujo fundo é simples, verde ou azul, remetendo-nos para o filme do qual proveio a inspiração para a coleção. O principal elemento da coleção são as gabardinas. Segundo a Vogue Portugal, as peças contam com “silhuetas definidas e ombros exagerados”. A paleta de cores varia entre o verde, o fúcsia, o vermelho e o amarelo. A expressão facial dos modelos não representa nenhuma emoção.

O conjunto dos cenários, juntamente com a expressão facial dos modelos, representa um mundo desumanizado, o que pode ser interpretado como uma crítica à sociedade tecnológica dos dias de hoje. Remetem-nos também para o mundo distópico de Matrix, um filme de ficção científica.

A Balenciaga criou, com esta campanha, uma ideia de que é impossível fugir à tecnologia, apresentando os modelos quase como avatares de um jogo ou personagens de um filme distópico. Parece, também, reforçar a divisão social do luxo, com a noção de que apenas pessoas importantes utilizam as peças da marca.

Esta campanha foi lançada numa altura em que se falava do impacto da tecnologia na vida das pessoas, assim como quais são os perigos associados à mesma. Foi também uma altura em que os filmes de realidades distantes e distópicas tinham bastante visibilidade, por isso a marca tirou inspiração do filme Matrix para a criação da coleção.

Campanha de 2022: a polêmica

A campanha não utiliza nenhum elemento textual, exceto a estampa da logo da marca em algumas peças (como na almofada), ampliando as possibilidades de interpretação/ ambiguidade do conteúdo. Se o texto estivesse presente, algumas direções de interpretação poderiam ser supostas, num contexto de quebra de padrões ou a questão do luxo disruptivo. Entretanto, como não existe essa presença, a interpretação do indivíduo consumindo a imagem é livre, consequentemente fatores como ambiguidade e controvérsias estão presentes como possibilidade na interpretação.

Dentre os principais elementos visuais está uma criança ruiva com expressão apática, segurando um urso de pelúcia com acessórios normalmente utilizados num contexto sexualizado. Mostra também um quarto com decoração infantil, presença significativa da cor rosa, animais de pelúcia e em seguida itens totalmente controversos, como jóias, óculos de sol, copos e sacolas. A parede com dragões deixa, ainda, o ambiente com uma estética mais gótica. Nesse sentido, há um conflito entre o que seria uma quarto/mundo infantil com os objetos que não apenas são mais adultos, como também implicam uma narrativa que traz elementos góticos, de fetichismo implícito e acessórios de luxo.

Os extremos entre a infantilidade, logo a inocência, e os elementos visuais mais adultos com algumas características sexualizadas, geram uma tensão proposital com intuito de chocar, chamar atenção e gerar desconforto. Os acessórios predispostos, como, por exemplo, a bolsa de pelúcia com detalhes que podem ser considerados fetichistas, podem conotar interpretações que se direcionam a temáticas como poder, submissão e rebeldia, características associadas a um contexto adulto. Existe claramente uma intenção de subverter o quarto infantil típico quando inseridos os elementos com as características mais adultas.

A Balenciaga, considerando um viés histórico, associa a sua marca à revolução, rompimento dos limites entre a moda, a arte e a cultura e à provocação. Portanto, a construção do mito, neste caso, gira em torno da ideia da moda como uma arte que quebra os padrões e as normas sociais pré-estabelecidas. Todavia, a construção da campanha com a criança como elemento central num contexto ambíguo entre dois extremos conflitua com valores sociais dominantes de proteção à infância, despertando no público a necessidade de crítica.

A campanha foi construída e lançada num contexto em que a provocação e a necessidade de chamar atenção do consumidor no ambiente digital, principalmente nas redes sociais são estratégias comuns e praticamente exigidas das empresas, considerando o público-alvo. Contudo, essa estratégia, especificamente nesta campanha, teve uma receção negativa do público, que a caracterizou como insensível e potencialmente exploradora ao associar crianças a objetos visualmente simbólicos da sexualidade adulta. O exemplar da campanha escolhido para análise é a imagem acima, entretanto a campanha envolve outras imagens, com outras crianças.

Ao gerar essa mensagem, como elaborada na linha de raciocínio acima, houve um afastamento do público-alvo, considerando que este interpretou a campanha como desrespeitosa e irresponsável. O desconforto que a campanha gerou no público a fez alvo de críticas severas, acusações de sexualização infantil, etc. Isso colocou em risco para a Balenciaga a reputação que já estava estabelecida socialmente, forçando-a a tomar diversos tipos de medidas para se reconciliar com o público.

Campanha 2024

A campanha não utiliza nenhum elemento textual, exceto a estampa da logo da marca em algumas peças (como nas calças e nos casacos), ampliando as possibilidades de interpretação/ ambiguidade do conteúdo. Esta campanha é composta por modelos vestidos com roupa activewear e posando de uma maneira que remete aos exercícios físicos. Neste caso, parece que estão a correr. Sendo assim, o intuito desta campanha é destacar completamente a coleção de roupa activewear.

Dentre os principais elementos visuais estão o homem e a mulher vestidos com roupa de treino, a olharem diretamente em frente com expressões apáticas em um cenário simples. Nesta campanha, temos uma estética muito limpa, de modo a destacar a roupa a ser utilizada pelos modelos. A campanha só de activewear mostra a versatilidade da marca, que consegue ter sucesso com roupas de altacostura e com roupas esportivas.

Campanha “The main Characters” (outubro 2024)

Esta campanha também não utiliza nenhum elemento textual, ampliando as possibilidades de interpretação/ ambiguidade do conteúdo. A campanha The characters é composta por celebridades icônicas, como Kim Kardashian (figura pública), Naomi Watts (atriz), Isabelle Huppert (atriz) e Michelle Yeoh (atriz). Estas personalidades trazem um grande reconhecimento à marca, tendo em conta que estabelecem uma relação entre a marca e os seus fãs

Cada modelo destaca um elemento específico da coleção, contribuindo para a construção da identidade da campanha. A estética é limpa e simples, deste modo o foco se mantém está nos produtos apresentados. Pode-se argumentar que a intenção da marca com esta campanha é precisamente realçar estas quatro personalidades e as malas que elas seguram, sem que houvesse cenários que as ofuscassem. A luz realça perfeitamente as modelos e os produtos.

Quando a marca decide relacionar o seu produto com quatro figuras públicas de diferentes gerações, a marca parece construir o mito de que os produtos da Balenciaga são atemporais. Esta campanha é destinada a um público da marca mais sofisticado, que procura qualidade. Com o seguimento das fotografias, podemos notar uma diferença significativa nas respetivas campanhas, desde o uso das cores e símbolos e inclusive os ângulos em que as fotografias foram tiradas.

Conclusão

Este trabalho parte da questão “como a semiótica pode analisar a recodificação pública da marca antes e depois da polémica de 2022?”. Para respondermos à questão, analisamos cinco campanhas da Balenciaga para vermos a evolução da imagem pública da mesma. Durante as campanhas de 2018 e 2019, conseguimos observar que a marca tinha uma imagem bastante sólida no mundo da moda e era bem vista pelo seu público-alvo. As suas campanhas inspiraram-se no quotidiano e em filmes, conseguindo que os seus clientes aderissem de bom gosto às novas coleções. O mito gerado em torno da campanha de 2018 reforçava a ideia de que quem compra as peças da Balenciaga é tão importante como uma celebridade e, na campanha de 2019, fazia com o público se sentisse parte do filme Matrix. Para além disso, pode-se interpretar as imagens como uma crítica social à adoração das celebridades e à sociedade tecnológica, respetivamente.

A campanha de 2022 teve nos clientes o efeito completamente oposto, tendo este reagido com contestações nas redes sociais e até um boicote aos artigos desta coleção. Isto fez com que a Balenciaga perdesse credibilidade, pois, mesmo com as justificações por parte da direção criativa, o público não desculpou a utilização de crianças para publicitar artigos de adultos.

Nas campanhas de 2024 são apresentados artigos desportivos para fazer contraste com os produtos habituais de alta-costura e, na campanha de outono, são utilizadas celebridades de gerações diferentes como modelos, numa forma de aumentar o reconhecimento e a credibilidade da marca. A ideia parece ser reforçar a mensagem de que os artigos Balenciaga são duradouros, feitos para todas as gerações.

No caso da Balenciaga, o envolvimento em polémicas teve um impacto negativo na visão do público a seu respeito. A partir da polémica de 2022, a marca começou a optar por campanhas menos elaboradas e com temas menos controversos. Esta alteração se afastou da identidade visual que Cristóbal Balenciaga criou, o que levou a Balenciaga a investir em elementos menos elegantes e que desafiam padrões da moda. Exemplos são a adaptação do saco da IKEA em mala e de sacos de lixo em mala.

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