Observatório da Qualidade no Audiovisual

Análise Reality Show Secret Story

Por: Beatriz Monteiro, Lucas Santos, Luísa Guerreiro, Mafalda Nobre, Tatiana Santos

Esta é uma análise semiótica do programa de televisão Secret Story. Esta análise terá como foco a questão: Como é que a decoração e as temáticas do Secret Story influenciam a atuação das personagens?

Secret Story é um programa de televisão em formato de reality show que já teve várias edições e, atualmente, está em exibição no canal televisivo TVI. Este reality show já teve várias versões em diversos países, incluindo Portugal e França, onde fez muito sucesso. O conceito do programa centra-se num grupo de concorrentes, cada um com o seu segredo, que vivem juntos numa casa isolada do mundo exterior. O objetivo é descobrir os segredos dos outros participantes, mantendo o seu escondido, acumulando dinheiro na conta final.

Será feita uma breve análise de outros programas do mesmo formato, anteriormente exibidos na estação televisiva TVI, de forma a justificar e comparar com o programa escolhido. Dentro da análise realizada do ponto de vista semiótico de Charles Peirce, serão também selecionadas algumas cenas específicas.

Comparação entre diferentes reality shows portugueses

Big Brother

O Big Brother é um dos reality shows mais conhecidos e icónicos a nível mundial, onde o conceito básico do programa envolve um grupo de pessoas que vive numa casa completamente isolada do mundo exterior, sob vigilância constante, sendo filmados 24 horas por dia. Os participantes são eliminados semanalmente até restar apenas um vencedor, que ganha um prémio monetário.

O programa tem como principais características:

Casa vigiada

Tal como no Secret Story ou na Quinta, os participantes do Big Brother vivem numa casa isolada do mundo, onde são vigiados por câmaras em todas as divisões. Não têm acesso ao exterior, incluindo telefones, internet, ou qualquer tipo de comunicação com amigos e familiares. Isso faz com que as interações entre os concorrentes sejam o foco do programa.

Nomeações e expulsões

Semanalmente, os concorrentes nomeiam-se uns aos outros para serem expulsos da casa. Normalmente, os quatro ou mais participantes com mais nomeações são submetidos a uma votação onde o público, através de chamadas telefónicas, pode votar para expulsar ou salvar um dos nomeados da semana.

Confessionário

Um dos elementos icónicos do Big Brother é o Confessionário, um espaço onde os concorrentes falam diretamente com o Big Brother (uma entidade invisível que comanda o jogo) para fazer nomeações, discutir estratégias ou simplesmente desabafar sobre o que estão a sentir. Estas conversas são, muitas vezes, reveladoras e podem influenciar o jogo.

Tarefas e Provas

Para movimentar o dia a dia na casa, os concorrentes recebem tarefas e provas semanais. Estas podem ser físicas, mentais ou de grupo. O sucesso nas provas pode resultar em prémios, imunidades ou mesmo dinheiro extra para as compras semanais de mantimentos.

Jogo social e estratégico

O Big Brother é tanto um jogo social como um jogo estratégico. Os concorrentes formam alianças, criam rivalidades e manipulam-se uns aos outros na tentativa de evitar a própria nomeação e de ganhar o apoio do público. As personalidades fortes e as dinâmicas sociais muitas vezes criam situações de drama e tensão, que são um dos grandes atrativos do programa.

Público como juiz

O poder do público é uma das características centrais do programa. São os espectadores que decidem quem fica e quem sai, e também quem será o grande vencedor. Este envolvimento direto do público é um dos grandes apelos do programa.

Provas do Líder

Existe também a prova do “Líder da Semana”, onde o vencedor da prova obtém poderes especiais, como a imunidade ou a possibilidade de nomear diretamente alguém.

A Quinta

A Quinta é outro dos reality shows portugueses, transmitido também pelo canal televisivo TVI, onde mistura a convivência e o trabalho rural. O principal objetivo é colocar um grupo de concorrentes (celebridades ou pessoas anónimas) numa “quinta” (casa onde o exterior é transformado numa quinta e a decoração do seu interior remete-nos a uma casa rural), onde o grupo deve viver e trabalhar, assumindo tarefas agrícolas enquanto competem pelo grande prémio final.

O programa tem as seguintes características:

Ambiente rural

Ao contrário dos outros realitys shows que decorrem em casas luxuosas, A Quinta decorre numa casa simples sem relíquias, onde interiormente tem uma decoração rural e o seu exterior é transformado numa quinta onde os concorrentes precisam de cuidar dos animais, plantar, colher e realizar outras tarefas típicas de uma vida rural. Este ambiente desafia os participantes a sair da sua zona de conforto, principalmente os que estão habituados a um estilo de vida urbano.

Tarefas diárias

Os concorrentes recebem tarefas diárias relacionadas com o ambiente rural. Isto inclui acordar extremamente cedo, alimentar os animais, cuidar das plantações e manter o espaço limpo e organizado. As tarefas são atribuídas pela produção ou por um “capataz”, que é eleito ou escolhido semanalmente.

Capataz da semana

O capataz é escolhido através de provas ou votações entre os concorrentes e é uma figura central no jogo. Este concorrente tem responsabilidades especiais e algum poder dentro da quinta, tais como a supervisão das tarefas e, em algumas situações, a nomeação de colegas para possíveis expulsões.

Provas e desafios

Como em muitos reality shows, os concorrentes participam em provas e desafios que testam a sua resistência física, habilidade ou capacidade de trabalhar em equipa. As provas são uma forma de ganhar privilégios, imunidades ou até mesmo recursos para o funcionamento da quinta, como comida ou ferramentas.

Nomeações e expulsões

Semanalmente, os concorrentes nomeiam alguns dos seus colegas para serem expulsos. Tal como noutros reality shows, é o público que decide quem deve sair através de uma votação via telefónica.

Isolamento e convivência

Tal como em outros programas do mesmo formato televisivo, os concorrentes encontram-se isolados do mundo exterior e isto cria um ambiente propício a alianças e/ou confrontos.

Interação com animais

Um dos aspetos mais diferenciadores de A Quinta é a interação dos concorrentes com os animais presentes. Além de cuidar dos animais (vacas, cabras, galinhas, etc.), alguns concorrentes formam laços com eles, e essa convivência é um elemento que traz um toque emocional e, por vezes, cómico ao programa.

O que torna “A Quinta” um programa atrativo é a combinação de um cenário de vida rural com as tensões típicas de um reality show. As tarefas agrícolas colocam os concorrentes em situações novas e desafiantes, enquanto o isolamento e as eliminações semanais trazem o drama e a competição que o público adora. Além disso, a interação com os animais e o trabalho físico proporcionam momentos únicos e cómicos que atraem uma audiência diversificada.

Secret Story

O Secret Story é também um dos programas de reality show. Neste caso, está a ser atualmente exibido pela TVI como a oitava edição, que, em apenas três semanas, tornou-se líder de audiências. É um reality show muito popular que teve várias versões em diversos países, incluindo Portugal e França, onde fez muito sucesso. O conceito do programa gira em torno de um grupo de concorrentes que vivem juntos numa casa isolada, onde cada participante tem um segredo pessoal que deve manter escondido dos outros concorrentes. O objetivo é descobrir os segredos dos outros participantes, protegendo o seu ganhando, com isso, dinheiro.

O programa tem como principais características:

Segredos

Cada concorrente entra na casa com um segredo e o principal objetivo é manter esse escondido dos rivais enquanto tenta descobrir os segredos destes. Existem pistas dos segredos de cada concorrente dentro da casa onde estes têm de ter atenção a isso, de modo a manter o seu segredo escondido.

Casa vigiada

Os concorrentes vivem numa casa vigiada por câmaras, 24 horas por dia, sem contacto com o mundo exterior e sem acesso a dispositivos eletrónicos. A casa geralmente tem uma decoração extravagante e áreas secretas.

Confessionário

Um dos elementos icónicos do Secret Story é o Confessionário, um espaço onde os concorrentes falam diretamente com a “Voz” (uma entidade invisível que comanda o jogo) para fazer nomeações, discutir estratégias ou simplesmente desabafar sobre o que estão a sentir. Estas conversas são, muitas vezes, reveladoras que podem influenciar o jogo.

Botão dos segredos

Na casa, há um botão especial que se encontra no confessionário. Se um concorrente acredita ter descoberto o segredo de outro, pode carregar no botão e fazer uma acusação. Se estiver correto, ganha todo o dinheiro do outro e caso esteja errado, perde dinheiro da sua conta para a do seu adversário.

Tarefas e desafios

Ao longo do programa, os participantes recebem diversas tarefas e desafios propostos pela “Voz”. Esta entidade desempenha um papel importante, onde cria missões (que, se forem bem-sucedidas, geram dinheiro aos concorrentes) e mantém o suspense. Por vezes torna-se um conselheiro dos concorrentes quando os mesmos estão mais frágeis.

Nomeações e expulsões

Semanalmente, existem as nomeações. Através destas, os concorrentes votam para que alguns dos seus colegas sejam colocados à mercê da votação do público. Os espectadores, através de linhas telefónicas decidem quem deve sair da casa.

Prémio final

Quem vencer, receberá um prémio monetário mais o dinheiro que tiver acumulado na sua conta final. Os restantes finalistas receberão apenas o dinheiro que tiverem no saldo da sua conta.

Dinâmicas sociais e estratégicas

Como qualquer reality show, as interações entre os concorrentes geram alianças, conflitos e estratégias de jogo, o que aumenta o drama e a imprevisibilidade. Todos estes programas acima mencionados, apesar das suas diferenças, captam a essência da convivência humana e buscam notoriedade e aceitação, surgindo a partir da curiosidade do público sobre a vida dos outros.

Entre os três formatos de reality shows analisados, o nosso grupo decidiu optar por fazer um estudo sobre o Secret Story, por se tratar de um programa que desafia tanto os participantes quanto o público a interpretar e atribuir significados às ações, interações e elementos presentes na narrativa. A combinação entre o jogo psicológico, as relações interpessoais e a constante presença de enigmas cria um cenário único, onde a construção de sentido está sempre em movimento. Essa complexidade narrativa e a ênfase na interpretação de signos tornam o Secret Story especialmente relevante para uma análise semiótica aprofundada.

Elementos de análise

O programa Secret Story decorre dentro de uma casa, um espaço físico que, embora pequeno, assume um papel central na narrativa ao se transformar num microcosmos de interação humana e exposição mediada onde as regras do programa, o isolamento do mundo exterior e as relações interpessoais são levadas ao limite. Nesse contexto, a semiótica de Charles Sanders Peirce, com as categorias de índices, ícones e símbolos, oferece uma abordagem essencial para perceber como os elementos narrativos e estéticos do programa comunicam significados complexos.

A casa do programa é, simultaneamente, um ícone e um símbolo. Como ícone, representa um ambiente separado do mundo exterior, delimitando o espaço público e privado dos participantes. No entanto, também atua como um símbolo tanto de privacidade como de exposição, tendo em conta que os concorrentes vivem sob vigilância constante. Os diferentes espaços, como o “quarto secreto” e a “sala de eliminação”, reforçam visualmente a tensão e as dinâmicas entre os participantes, além de se tornarem representações concretas das decisões e mudanças no jogo.

Os índices presentes no programa reforçam a conexão existencial entre os signos e os seus objetos:

Câmaras de Vigilância

As câmaras de vigilância instaladas em cada canto da casa atuam como índices da exposição constante, lembrando os participantes e o público de que cada movimento é observado.

Gestos e atitudes dos participantes

O comportamento dos concorrentes, como os seus gestos, expressões ou atitudes, servem como índice das emoções e tensões vividas. Por exemplo, um participante que aparenta estar nervoso e evita contacto visual pode indicar uma mentira ou desconforto em relação a uma situação específica.

Isolamento ou conflitos

O afastamento de um participante em momentos de tensão é um índice de possível desconfiança ou exclusão. Discussões acaloradas, por sua vez, apontam diretamente para o aumento de conflitos e para o impacto emocional coletivo, que molda o desenrolar das relações na casa.

Os ícones no programa são utilizados para evocar reações e estabelecer uma conexão direta entre o signo e o seu objeto por meio de semelhanças. Alguns exemplos relevantes incluem:

Expressões faciais e corporais

As emoções dos concorrentes, como um sorriso, lágrimas de frustração ou gestos brutos, funcionam como ícones visuais que refletem os estados emocionais vividos. Esses elementos não apenas representam sentimentos, mas também amplificam a narrativa emocional para a audiência.

Decoração da casa

A casa onde decorre o reality show, com as suas divisões e o seu ambiente exterior, funciona como um ícone que separa o mundo “público” e “privado” dos participantes. Certos espaços da casa simbolizam momentos de suspense e decisão. Cada divisão reforça visualmente as dinâmicas do programa, criando o cenário que traduz em ícones tangíveis os conceitos de mistério e competição.

Segredos dos participantes

O próprio conceito de “segredo” funciona como um ícone, pois visualmente representa algo oculto, esperando para ser desvendado. Essa ocultação é representada simbolicamente nos confessionários e na própria dinâmica de revelação de segredos.

Os símbolos em Secret Story baseiam-se em convenções culturais e contextuais, com significados amplamente compartilhados pelo público. Exemplos notáveis incluem:

Logótipo do programa

O olho ilustrado no logótipo é um símbolo do conceito de vigilância e mistério. Embora não tenha uma ligação física direta com a dinâmica do programa, ele evoca a ideia de observação constante e do papel ativo do público como “testemunha” do jogo.

O Segredo

O segredo é mais do que uma característica do jogo; é um símbolo de poder e controlo. Culturalmente, os segredos representam algo valioso, algo que os concorrentes buscam proteger ou explorar para avançar no jogo.

Votação pública

O ato de votar para eliminar ou salvar um concorrente transcende a funcionalidade prática e torna-se um símbolo de poder democrático. O público é simbolicamente colocado como um participante ativo, moldando a narrativa e influenciando o destino dos participantes.

Estilos de roupa e acessórios

A escolha de vestuário por parte dos concorrentes é outro símbolo cultural importante. Por exemplo, roupas chamativas podem representar a busca por protagonismo ou carisma, enquanto roupas mais discretas podem simbolizar estratégias de invisibilidade ou contenção emocional.

Passando para as categorias fenomenológicas, vamos começar com a primeiridade. Esta refere-se às primeiras impressões e às qualidades sensoriais que impactam diretamente os participantes e espectadores. Neste contexto, a primeiridade é fundamental para compreender como os elementos visuais e sonoros da produção influenciam as emoções espontâneas.

Aplicação ao ícone

Ícones como as expressões faciais dos participantes (sorrisos, lágrimas, gestos) ou o design da casa (cores vibrantes, elementos chamativos) exemplificam a primeiridade ao gerar reações emocionais imediatas. A escolha de uma paleta de cores alegres, por exemplo, atua como um ícone visual que evoca sensações de conforto e positividade, minimizando o impacto psicológico do confinamento.

Impacto geral no programa

Reações espontâneas, como o choque de um concorrente ao ser nomeado ou a alegria ao vencer um desafio, capturam a essência da primeiridade. Essas respostas são qualitativas e pré-reflexivas, impactando tanto a audiência quanto a narrativa do programa.

Desta maneira, a secundidade abrange interações concretas e relações factuais entre os elementos do programa, marcadas por ações e consequências.

Aplicação ao índice

Os índices manifestam-se nas interações diretas e nas reações contextuais do programa. Por exemplo, gestos tensos indicam desconfiança, enquanto o isolamento de um participante sugere conflito ou desentendimento. Além disso, eventos como discussões, alianças e revelações de segredos têm impacto direto na dinâmica do grupo e refletem relações de causa e efeito, evidenciando a secundidade.

Impacto geral no programa

A secundidade é central nos momentos de tensão, como a revelação de um segredo. O impacto emocional nos participantes e na audiência demonstra como uma ação desencadeia uma série de reações que moldam a narrativa.

Por último, a terceiridade conecta os signos e suas interpretações à cultura e às estratégias narrativas que transcendem o literal. É a categoria que promove generalizações e padrões.

Aplicação ao símbolo

Os símbolos em Secret Story (como o logotipo, os segredos ou os votos do público) ilustram a terceiridade por carregarem significados complexos e universais. O segredo de cada concorrente, por exemplo, vai além do seu contexto individual e transforma-se num símbolo de poder e estratégia, influenciando tanto o comportamento dos participantes quanto as perceções do público.

Impacto geral no programa

A terceiridade manifesta-se nas narrativas construídas ao longo do programa, como a criação de herois e vilões para envolver emocionalmente o público. A interação simbólica entre concorrentes e audiência reforça a universalidade do formato, transformando o programa numa experiência culturalmente rica e emocionalmente envolvente.

O objeto de investigação

Para realizarmos a análise semiótica do programa de televisão da TVI, Secret Story, recorremos a imagens onde centramos a nossa atenção em determinados aspetos que são frequentemente ignorados pelos telespectadores, como cores, posição de certos objetos de decoração e sons. Esses elementos são analisados à luz das categorias da semiótica peirceana, com o objetivo de compreender como os significados são construídos e comunicados no programa.

Durante os três meses de programa, são criadas dinâmicas e missões pela Voz, nas quais os concorrentes muitas vezes inventam histórias de modo a enganar os seus colegas, enquanto tentam descobrir os segredos dos outros para acumular dinheiro na conta. Esta faceta do programa, que nunca se sabe o que é verdade ou o que é mentira, transforma-se num signo de manipulação e estratégia. A constante troca entre o real e o fictício é uma característica fulcral do programa.

O jogo narrativo é reforçado pela estética visual e sonora, que atua tanto na construção da experiência dos concorrentes quanto no impacto sobre o público. Por exemplo, a decoração da casa utiliza uma paleta de cores vivas e chamativas, que cria um ambiente leve e alegre, ajudando a reduzir o impacto psicológico do confinamento. A ausência de contacto com o exterior e a vigilância contínua podem levar ao cansaço emocional dos participantes; no entanto, as cores vibrantes ajudam a contrabalançar esses efeitos, evocando sensações de alegria e felicidade. Este cuidado estético é essencial, pois, ao contrário de paletas neutras ou escuras que poderiam suscitar solidão ou tristeza, estas cores favorecem um ambiente imersivo e positivo.

Do mesmo modo, os sons desempenham um papel narrativo importante. Quando um concorrente acredita ter descoberto um segredo, desloca-se ao confessionário e ativa um botão vermelho que emite um som semelhante a uma sirene. Este som, imediatamente associado à tensão, é percebido como um signo de ansiedade tanto pelos participantes quanto pelo público, amplificando a expectativa sobre a revelação do segredo.

Além disso, o envolvimento dos telespectadores na dinâmica do programa é outro aspeto que merece destaque. A votação feita pelo público via telefónica torna-se um signo de poder, na medida em que as decisões da audiência influenciam diretamente o destino dos concorrentes e moldam a narrativa do programa. Esta participação ativa estabelece uma relação simbólica entre os telespectadores e os participantes, transformando o público num jogador indireto.

Por fim, focamo-nos especialmente nas estratégias narrativas implícitas, com atenção às cores que são utilizadas para criar climas emocionais. Por exemplo, a disposição dos objetos no espaço sugere hierarquias ou dinâmicas de poder entre os concorrentes, sendo a temática do “líder da semana” uma forma de evidenciar a discrepância entre os participantes ao longo do jogo. A escolha da música de fundo, os efeitos sonoros e até mesmo os diálogos dos participantes contribuem para criar momentos de alta tensão e manter as emoções à flor da pele.

Dessa forma, a análise semiótica deste reality show procura ir além da superficialidade do entretenimento televisivo, desvendando como elementos aparentemente simples podem ser carregados de significados complexos, por vezes indecifráveis para alguns dos telespectadores. Através dessa abordagem, é possível revelar as intenções comunicativas por trás da produção e a forma como estas moldam a experiência do espectador.

Seguindo para a análise das imagens, conseguimos ver abaixo duas destas que representam o tópico das pistas presentes nos elementos decorativos da casa.

Nestas duas primeiras imagens, podemos ver como a decoração e as cores que são colocadas na casa podem influenciar o jogo dos concorrentes. A Voz, a entidade do programa, decidiu colocar naquela manhã, por detrás de um vidro fumado, pistas sobre o segredo de um dos concorrentes. Os mais rápidos a chegar ao vidro tiveram a possibilidade de observar uma caixa de música com uma bailarina lá dentro, um tutu e uns sapatos profissionais de ballet. Estes itens tinham o propósito de ajudar os concorrentes a desvendar um dos segredos da casa, deixando-os intrigados e confusos. 

Relativamente às cores, observamos que a caixa é preta, enquanto o boneco no seu interior é de cor clara, estabelecendo uma distinção de significados entre ambos. O preto pode representar a dificuldade associada à prática do ballet, simbolizando a dor e o esforço necessários para se dedicar a esta arte. Por outro lado, o boneco branco dentro da caixa preta pode representar a persistência e perseverança do dançarino, assim como a liberdade que sente ao dançar ballet. Estas cores podem levar os jogadores que encontram estas pistas a associar o segredo a um colega confiante, persistente, esforçado e ciente das suas capacidades dentro da casa.

Numa das divisões da casa, a produção decorou-a com vários elementos relacionados a pistas, com o intuito de ajudar os concorrentes a desvendar segredos. Nas imagens acima, conseguimos ver um dos concorrentes a dirigir-se a essa mesma divisão onde, no televisor, observou uma imagem que remetia ao segredo de um dos seus colegas de jogo. Para além da imagem que estava projetada na televisão, toda a decoração daquela divisão da casa tinha elementos que revelavam ser pistas de alguns dos concorrentes do programa. Isto levava a que cada concorrente que entrasse naquela divisão, estivesse atento a todos os pormenores. 

As cores predominantes nesta sala, maioritariamente escuras, podem sugerir que muitos dos segredos expostos neste espaço têm um carácter menos positivo na vida dos concorrentes que participam no concurso. Por outro lado, todos os objetos desta sala possuem uma influência direta com o jogo, fornecendo indicações dos segredos de todos os jogadores que têm a oportunidade de a visitar.

Outros dos fatores que influenciam o sucesso deste programa de televisão é a escolha das cores nos elementos decorativos da casa e algumas dinâmicas que são realizadas ao longo do dia. Como podemos observar na primeira imagem, os concorrentes encontram-se na sala, a divisão mais importante da casa. Tal como esta, todas as outras divisões são decoradas com cores chamativas e alegres. Acreditamos que a produção optou por esta paleta de cores para cativar os participantes a continuar no programa e reduzir as probabilidades de desistência.

Embora o programa seja uma experiência social, também é um jogo que por vezes pode afetar o psicológico dos concorrentes. O isolamento do exterior, a ausência de dispositivos online (telemóveis, televisão, redes sociais), o afastamento da família e amigos, aliado à vigilância constante das câmaras distribuídas por toda a casa, pode gerar um desgaste emocional. Nesse contexto, a escolha de cores alegres e fortes é um fator bastante positivo, pois criam um ambiente que remete à alegria e à felicidade. Este ambiente colorido ajuda os concorrentes a sentirem-se mais confortáveis, diminuindo a necessidade de ligação ao exterior. Por outro lado, uma paleta de cores mais neutras e escuras poderia induzir sentimentos de solidão e tristeza, o que não seria adequado ao formato televisivo.

Outro fator como referimos são as dinâmicas diárias. Ao longo do dia, os concorrentes são convocados pela Voz para comparecer na sala, onde são confrontados com temas, perguntas, jogos ou até mesmo brincadeiras. Estas atividades maioritariamente resultam em divergências de opinião, que podem levar à discórdia e gerar discussão entre os concorrentes. Além disso, as dinâmicas têm como objetivo manter os concorrentes ocupados e minimizar a sensação de isolamento. Os intervalos entre estas atividades poderiam ser considerados tempos “livres” onde os participantes não teriam nada para fazer até ao próximo encontro na sala, porém isso não acontece. Cada dinâmica é pensada e planeada com muita atenção, o que faz com que a mesma seja tema de conversa entre todos, e por vezes discussão, durante o tempo suficiente até que a Voz chame os concorrentes para a próxima dinâmica.

Considerações finais

Com a realização deste trabalho, conseguimos entender como a semiótica é tão importante na nossa vida e está sempre presente sem nos apercebermos dela. Acabamos por responder à nossa questão inicial e verificar como é que a decoração e as temáticas dentro da casa mais vigiada do país podem influenciar a participação dos concorrentes ao longo de todo o jogo. Ficamos a entender melhor, também, o objetivo da semiótica de Peirce, assim como o seu intuito e o que tenciona estudar. 

Compreendemos que a semiótica peirceana não só nos ajuda a interpretar os elementos visuais e sonoros presentes no programa, como também nos permite perceber como esses signos influenciam o comportamento e as relações humanas. Na análise do Secret Story 8, identificamos que cada detalhe é importante para o nosso estudo, desde a cor das paredes até os sons utilizados em momentos estratégicos, o que desempenha um papel crucial na construção das dinâmicas ao longo do jogo, afetando a maneira como os concorrentes interagem entre si e no espaço em que estão inseridos.

Este trabalho também nos levou a refletir sobre como a comunicação visual e simbólica impacta as nossas próprias percepções enquanto espectadores. Muitas vezes, as escolhas estéticas e narrativas direcionam-nos inconscientemente a criar julgamentos ou a tomar partido de alguém, demonstrando o poder que os signos têm na formação de significados e emoções no ser-humano.

Por fim, esta análise evidenciou a relevância da semiótica como ferramenta de investigação académica, destacando a sua aplicabilidade em diversos campos, como o audiovisual, o design, a publicidade e a comunicação social. Ao desvendarmos os significados por trás dos signos, somos capazes de compreender melhor os mecanismos que regem as narrativas mediáticas das histórias dos participantes e, ao mesmo tempo, tornamo-nos espectadores muito mais críticos e conscientes.

Dessa forma, o trabalho realizado por todo o grupo não só respondeu à nossa questão inicial, mas também aprofundou o nosso conhecimento pelos processos semióticos, deixando claro como eles estão intimamente ligados à experiência humana e à forma como interpretamos o mundo ao nosso redor.

Referências

Infonauta. (n.d.). Semiótica peirceana: Resumo. https://infonauta.com.br/aulas-diversas/semiotica-peirceana-resumo

RODRIGUES, Cassiano Terra. Peirce, Charles Sanders. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga e André Luiz Freire (coords.). Tomo: Teoria Geral e Filosofia do Direito. Celso Fernandes Campilongo, Alvaro de Azevedo Gonzaga, André Luiz Freire (coord. de tomo). 1. ed. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2017.

DELEDALLE, Gérard. Écrits sur le signe. Paris: Éditions du Seuil, 1978.

PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. São Paulo: Perspectiva, 2000.

SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 1983.

Site do episódio da imagem 1 e 2 

Site do episódio da imagem 3 e 4 

Site do episódio da imagem 5 e 6

Observatório da Qualidade no Audiovisual

Comentar