Criada por Cláudio Torres, Renato Fagundes e Leandro Assis a série Magnífica 70 é exibida pelo canal pago HBO Brasil. Ao longo de seus 26 episódios, divididos em duas temporadas, a trama retrata o universo dos filmes da Boca de Lixo na durante a ditadura militar na década de 1970. A terceira temporada está prevista para estrear na emissora em outubro de 2018.
A série é protagonizada por Vicente (Marcos Winter), um censor do Departamento de Censura Federal do Estado de São Paulo. O personagem é casado com Isabel (Maria Luísa Mendonça), filha do General Souto (Paulo César Pereio) e vive a monótona rotina entre o trabalho e o casamento. Porém, o personagem tem a sua vida transformada após a avaliação de uma pornochanchada. Depois vetar o filme, Vicente (Marcos Winter) se apaixona pela atriz do longa-metragem, Dora Dumar (Simone Spoladore). O romance serve de ponto de partida para o desdobramento de outros arcos narrativos. Para tentar reverter a proibição do filme o protagonista começa a trabalhar em segredo com Dora (Simone Spoladore) e o produtor Manolo Mattos (Adriano Garib). Durante o processo, o personagem lembra da trágica morte de sua cunhada Ângela (Bella Camero).
Nesse sentido, a partir da paixão Vicente (Marcos Winter) a série Magnífica 70 reflete sobre a ditadura e a censura na produção audiovisual nacional. Ao mostrar os bastidores da Boca de Lixo a trama ressalta as dificuldades do cinema de baixo orçamento no Brasil da década de 1970 e os desafios enfrentados pelos diretores, produtores e elenco.
No Plano da Expressão iremos analisar os indicadores: ambientação, caracterização dos personagens, trilha sonora, fotografia e edição.
Por ter como pano de fundo a ditadura militar, a ambientação de Magnífica 70 é um ponto fundamental na série. Os episódios são compostos tanto por locações no estúdio quanto por sequências externas. Os cenários como, por exemplo, o Bar Imperador, a Magnífica Produções, a casa da família de Vicente (Marcos Winter) e o Departamento de Censura Federal reproduzem, de maneira fiel, os costumes da década de 1970, contribuindo diretamente para a verossimilhança da história. Nesse contexto, os elementos cênicos e os detalhes imagéticos enriquecem o universo ficcional. No Departamento de Censura Federal, por exemplo, todos os objetos do escritório tais como mesas e luminárias reforçam a tensão e o trabalho maçante do lugar. O mesmo acontece na a Magnífica Produções que chama a atenção pelas paredes velhas e mofadas.
As transições de cenário são marcadas por imagens da cidade São Paulo em 1970, as sequência acabam reforçando o trabalho feito pela direção artística nas sequências externas. Apesar de poucas, as cenas gravadas fora do estúdio são compostas por figurantes e mostram lugares que dialogam com a Boca do Lixo. Ou seja, o bairro da Luz em São Paulo, a rua do Triunfo, a rua Vitória, entre outros.
Entretanto, todas as sequências externas foram gravadas na cidade do Rio de Janeiro, o que só ressalta o trabalho realizado para direção de arte. Dessa forma, podemos afirmar que o indicador está presente de maneira pertinente em Magnífica 70, contribuindo para a proposta narrativa da série e reforçando universo ficcional criado por Cláudio Torres, Renato Fagundes e Leandro Assis.
Por se tratar de uma série de época a caracterização dos personagens de Magnífica 70 dialoga não só com o perfil de cada personagem, mas com período da década de 1970. De modo geral, os figurinos não são compostos por muitos detalhes e reafirmam a trajetória dos personagens na trama. Como, por exemplo, Vicente (Marcos Winter) que por conta de seu trabalho como censor e da rigidez familiar imposta pelo General Souto (Paulo César Pereio), está sempre de terno.
Já Dora (Simone Spoladore) usa roupas mais ousadas e coloridas, que representam a ocupação da aspirante a atriz e sua personalidade. Nesse contexto, o indicador dá continuidade ao que os outros elementos cênicos e narrativos apresentam ao telespectador.
A trilha sonora de Magnífica 70 tem como central a música de abertura da série. Interpretada pelos Secos & Molhados a canção Sangue Latino introduz ao telespectador, juntamente como trechos da trama e elementos gráficos, a atmosfera da atração.
O restante da trilha sonora da série ajuda na ambientação da história, que se passa na década de 1970, e é composta por artistas populares da época. As sequências da trama também contam com músicas instrumentais que ressaltam os desdobramentos narrativos.
Composta por tons escuros, como marrom e cinza, a fotografia de Magnífica 70 representa o clima de tensão imposto pela ditadura militar. As locações são sempre pautadas por penumbras, reforçando os segredos mantidos pelo protagonista Vicente (Marcos Winter) e a clandestinidade da Magnífica Produções.
Por fim, Magnífica 70 apresenta uma edição não linear. As cenas intercalam acontecimentos do presente e do passado conturbado de Vicente (Marcos Winter) e sua cunhada Ângela (Bella Camero).
Entretanto, como iremos detalhar mais adiante, as sequências são pautadas por setas chamativas que deixam claro que se trata de uma outra temporalidade.
No Plano do Conteúdo iremos destacar os seguintes indicadores: intertextualidade, escassez de setas chamativas, efeitos especiais narrativos, recursos de storytelling e transmedia literacy.
Por se tratar que uma série que aborda questões históricas e culturais na época da ditadura militar, Magnífica 70 apresenta várias referências externas ao universo ficcional. O indicador pode ser observado, por exemplo, no episódio Na Boca do Lixo, exibido pela HBO em 24 de maio de 2015.
Durante a gravação do final ‘alternativo’ de sugerido por Vicente (Marcos Winter) vemos que o longa metragem que estava sendo filmando antes pela equipe da Magnífica Produções é do Zé do Caixão. O personagem do cinema nacional do Brasil é visto ao fundo, em um cemitério, que posteriormente Dora (Simone Spoladore) iria gravar uma cena. Nesse contexto, a intertextualidade enriquece a experiência televisiva do público ao incorporar referências externas às tramas, mas que dialogam diretamente com os arcos narrativos apresentados na série.
Como discutidos brevemente na análise do Plano da Expressão, as setas chamativas em Magnífica 70 são usadas em momentos pontuais da trama e diminuem o esforço cognitivo analítico necessário para a compreensão da história. O recurso se apresenta, de modo geral, de duas maneiras: através dos diálogos dos personagens e através de alterações na fotografia e interseções gráficas. Isto é, constantemente os personagens, por meio dos diálogos, retomam os principais desdobramentos narrativos de Magnífica 70. As setas chamativas também estão presentes na analepse, dessa forma os flashbacks são sinalizados didaticamente para o telespectador através de mudanças na fotografia, as cenas ficam em preto e branco, e legendas no centro da tela indicado a cronologia do acontecimento. Nesse sentido, o indicador escassez de setas chamativas não foi observado na série da HBO Brasil.
Apesar de apresentar vários ganchos e clímax em momento algum o telespectador é obrigado a reconsiderar tudo o que viu até então. Ou seja, as reviravoltas presentes em Magnífica 70 não subvertem a história, apenas são consequências já esperadas na trama. Dessa forma, o indicador efeitos especiais narrativos não foi identificado.
Ao longo das duas temporadas da série é possível observar, em vários momentos, o uso de flashbacks. A analepse integra, principalmente, o arco narrativo da trágica morte da cunhada de Vicente (Marcos Winter), a jovem Ângela (Bella Camero), e ajuda o público a compreender e aprofundar na história do protagonista. Como os personagens vivenciam a censura e a tensão da ditadura militar, as sequências fantasiosas também estão presentes na trama. O recurso chama a atenção para o desejo e ambições dos personagens.
As ações transmídia de Magnífica 70 são direcionadas para o YouTube. Postados no canal da HBO Brasil na plataforma, os vídeos, com cerca de 5 minutos de duração, detalham alguns aspectos históricos e técnicos da trama.
Ao conhecer as informações dos bastidores o telespectador tem a ‘opção’ de assistir as cenas com a suspensão da descrença ou com respeito renovado pela perícia e competência técnica que tornava a cena crível. Entretanto, apesar de explorar novas perspectivas da trama, a ação transmídia não estimula o entendimento crítico do público ao correlacionar contextos linguísticos distintos e informações dissipares. Isto é, o conteúdo não propiciava a leitura atenta e criativa do telespectador. Desta forma, o indicador transmedia literacy não foi identificado.
Por Daiana Sigiliano
Ficha Técnica:
- Criado por: Cláudio Torres, Renato Fagundes e Leandro Assis
- Produção: Roberto d’Avila
- Roteiro: Cláudio Torres, Renato Fagundes e Leandro Assis
- Exibição: 24/05/2015 – atual
- Direção: Cláudio Torres e Carolina Jabor
- Duração: 60 minutos
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