Observatório da Qualidade no Audiovisual

TRAÇOS: Remediando a linguagem da animação

Clara Portela, Davi Barroso, Luísa Guimarães, Paulo Medeiros, Ricardo Souza e Hsu Ya Ya

Segundo Ribeiro (2019, p. 57), “a linguagem audiovisual caracteriza-se pela transmissão de uma mensagem que será compreendida […] pelo receptor, destacando-se a imagem como fator principal de comunicação”. Na animação, o fato de ser uma técnica que simula o movimento em objetos inanimados é o que a difere do cinema tradicional. Duran e Gamba Junior (2010) explicam que a inserção da animação na linguagem audiovisual disseminada pelo cinema deu dinamicidade aos produtos de animação, cativando o público através dos seus recursos. “Compreende-se a animação, via linguagem audiovisual, como um recurso atrativo para os espectadores capaz de captar sua atenção por meio de todas as linguagens que a compõem” (RIBEIRO, 2019, p. 56).

Lemos (2005) pontua que a cibercultura é regida pelo princípio de remixagem, como um “conjunto de práticas sociais e comunicacionais de combinações, colagens, cut-up de informação a partir das tecnologias digitais” (LEMOS, 2005, p.1), regido por três leis principais: emissão, conexão e reconfiguração. De acordo com o autor, a primeira lei se configura como a liberação do pólo da emissão, através da emergência de vozes e discursos; a segunda lei é regida pelo princípio da conectividade generalizada, a era da coletividade onde tudo se comunica e está na rede e, por último, a lei da reconfiguração que não mais remedia as mídias, mas modifica as práticas comunicacionais e suas estruturas.

A partir destas discussões, este projeto busca remediar elementos da linguagem da animação. O projeto, apresentado em seis episódios, discute a forma como a linguagem visual é elaborada nos desenhos selecionados, expondo diferenças e semelhanças entre as próprias animações. Segundo Ribeiro (2019, apud Duran, Gamba Junior, 2010, p. 46), mesmo tendo como base o real, a animação possibilita a criação de “personagens com características próprias, seja por meio de formas simplificadas, exageradas ou caricaturadas”. Com foco nos personagens e nas ambientações, abordando características como as expressões e as repetições, os episódios remediam esses elementos e refletem sobre os traços que compõem a animação brasileira contemporânea.

Na primeira etapa do projeto levantamos as animações brasileiras exibidas entre 2017 e 2019 em canais nacionais pagos, abertos e em plataformas de streaming, conforme o quadro a seguir: 

ANIMAÇÕESTV ABERTATV PAGASTREAMING
20171230
20181082
2019150

A partir deste levantamento, disponível aqui (https://bit.ly/3ifZlHL), selecionamos episódios para compor os episódios desta produção, cujas storylines estão a seguir:

DOS OLHARES (Hsu Ya Ya)

Da Vinci citou que “os olhos são a janela da alma”, os traços que caracterizam o seu formato, o brilho e as sensações são ressignificadas a partir dos traços que compõem as animações “O (sur)real mundo de Any Malu”, “Clube da Anittinha”, “Galinha Pintadinha Mini”, “Hora do Rock”, “As microaventuras de Tito e Muda”, “A turma da Mônica” e “Mônica Toy” buscando evidenciar de que forma as expressões dos personagens são transmitidas a partir dos olhos. 

EXPRESSÕES FACIAIS (Clara Portela)

O episódio procura evidenciar as características que dão vida aos sentimentos dos personagens animados. As imagens escolhidas mostram como os traços e os movimentos faciais transmitem ao espectador o que o personagem está pensando ou sentindo. Os desenhos utilizados foram: Oswaldo; Papaya Bull; Cupcake & Dino; WeeBoom.

OTIMISMO (Ricardo Souza)

Nas animações, os sentimentos de alegria e o otimismo são expostos por meio das expressões faciais e dos grandes sorrisos, facilmente identificáveis pelo público. Utilizando as combinações de imagens, colagens e cut-up presentes nas animações como “As Micro Aventuras de Tito e Muda”, “Cupcake & Dino: Serviços Gerais”, “Os Chocolix”, “O Surreal Mundo de Any Malu” e “Os Under-Undergrounds”, propomos remediar neste episódio os traços das expressões alegres e exageradas a fim de colocar em evidência esse tipo de recurso utilizado na linguagem das animações para levar o otimismo para o público.

MASCULINIDADE (Paulo Medeiros)

Desenhos animados acompanham o crescimento de crianças no Brasil e no mundo, influenciando seu modo de pensar e perceber o mundo. Entretanto, a linguagem de muitas destas animações acaba reforçando estereótipos de gênero, sexuais, de cor, entre diversos outros, seja através do comportamento dos personagens ou dos seus traços e expressões. Pensando nisso, procuramos ressignificar o que estamos acostumados a ver em animações brasileiras refletindo sobre os estereótipos e performances de gênero, construção e desconstrução da masculinidade, por meio de personagens LGBTs da animação “Super Drags” e vilões dos desenhos “As Aventuras de Fujirawa”, “Zuzubalândia”, “Bubu e as Corujinhas” e “Papaya Bull” que, quase sempre, se encaixam nestes estereótipos. 

SERES EXTRATERRESTRES (Davi Barroso)

O universo da ficção científica normalmente representa o imaginário, o futurismo, a exploração espacial e seres de outros planetas que desafiam a normalidade e assumem as mais diversas formas. Nesse episódio, buscamos reconfigurar e remediar diferentes produtos pertencentes a esse mesmo gênero a partir da seleção das seguintes animações: “As aventuras de Fujiwara Manchester”, Buzzu na Escola Intergaláctica” e “Planetorama”. Buscamos semelhanças entre eles para recriar aquilo que configura a essência desse gênero através dos traços dos personagens.

ANIMAIS (Luísa Guimarães)

Antropomorfizar é dar forma ou características humanas a algo que não é humano. Este recurso é frequentemente utilizado na mídia para representar os animais, transferindo para eles características próprias dos humanos. Os gestos, as roupas, as falas (animais que falam), as vivências, as experiências e até mesmo os sentimentos e expressões atribuídos aos animais não-racionais nas animações os aproximam dos seres humanos. Sendo assim, enfocamos diferentes expressões dos animais buscando transmitir e enfatizar sensações e traços comuns entre eles e os seres humanos. Os desenhos utilizados foram “Turma da Mônica”, “O Show da Luna”, “Bubu e as Corujinhas”, “Clube da Anitinha”, e “Tainá e Os Guardiões da Amazônia”.

Referências

DURAN, E.  R.  S.; GAMBA JÚNIOR, N. A linguagem da animação como instrumental de ensino. Rio de Janeiro, 2010. Dissertação   de Mestrado – Departamento   de   Artes   e   Design, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

LEMOS, A. Ciber-Cultura-Remix. In Seminário Sentidos e Processos, 2005. Disponível em: <https://www.facom.ufba.br/ciberpesquisa/andrelemos/remix.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2020.

RIBEIRO, P. V. Linguagem audiovisual num episódio do desenho animado “O Show da Luna!”: ludicidade e/ou aprendizagem conceitual via conceito educativo. São José do Rio Preto, 2019. Dissertação de Mestrado – Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, UNESP. Disponível em: <http://hdl.handle.net/11449/181445>.

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