Observatório da Qualidade no Audiovisual

Canal das Bee

“Não só um canal contra a homofobia. Um canal contra o preconceito, contra a transfobia, a bifobia, a lesbofobia, o machismo. Um canal a favor da diversão, do riso e de viver a vida do jeito que você quiser. E, principalmente, sendo quem você é! Canal das Bee, porque uma abelha só não produz nenhum mel”. Assim se apresenta o Canal das Bee, um canal de humor do YouTube criado em 20 de agosto de 2012 por um grupo de amigos que se propõe, além de fazer o público rir, a conscientizar e fazer as pessoas pensarem sobre todos os tipos de preconceitos que existem em nossa sociedade. Exibindo vídeos novos todas as terças e sextas-feiras, o canal contava em setembro de 2015 com 163.933 inscritos e 239 vídeos, sendo estes protagonizados principalmente por Jessica Tauane, uma das criadoras do canal, e uma pessoa convidada.

No plano da expressão, observamos que a vinheta de abertura e o cenário, presentes em quase todos os vídeos do canal, introduzem levemente o tema da aceitação e da diversidade sexual proposto pelos seus criadores. Na vinheta, ao som da animada música “Requiem For A Fish”, da “The Freak Fandango Orchestra”, uma pessoa cola na parede um adesivo do Canal das Bee, e em seguida quatro pessoas sorriem, fazem caretas e poses para a câmera, além de uma delas segurar na boca a bandeira do arco-íris, símbolo máximo da diversidade sexual, e imitar o andar do animal veado. Presente na maioria dos vídeos, a parede de fundo composta por diversos elementos que se referem ao mundo da diversidade sexual, como a bandeira da homoafetividade, as fotos de homossexuais se beijando, e a placa de trânsito com o veado, forma o cenário característico do programa, que, assim como a vinheta, introduz o tema chave do canal e deixa claro e evidente o seu caráter alegre e descontraído.

No plano do conteúdo, os resultados do indicador de qualidade ampliação do horizonte do público foram bem instáveis ao longo das análises. Do total dos 12 vídeos publicados pelo canal no mês de setembro, cinco são avaliados como muito bom; um como bom; e um como razoável. Nos outros cinco não é possível identificar elementos que contribuem para a ampliação do repertório cultural do público, pois tratam de jogos de perguntas e respostas que nada querem estimular o pensamento e o debate de ideias no espectador, mas apenas entretê-lo e aproximá-lo do canal, respondendo às suas perguntas e curiosidades. Mesmo não estando presente em todos os vídeos, percebe-se que nos outros formatos do canal (esquete, monólogo, entrevista e discussão) há uma preocupação em ampliar o horizonte do espectador a fim de fazê-lo refletir e combater os preconceitos existentes, como no esquete Como Ser Um Bom Gay Cis – Bee Fun, exibido no dia 04 de setembro. Nesse vídeo, os atores Herbet Castro e Mola representam, respectivamente, um gay preconceituoso e desinformado e outro gay que não gosta de preconceitos e tenta ensinar o amigo as formas corretas de se falar, pensar e agir. A trama, da forma como é escrita e interpretada, confere humor a um assunto sério e que precisa de visibilidade para a instrução e educação das pessoas.

O indicador diversidade de sujeitos representados, ao contrário do anterior, só não foi identificado em um vídeo do canal, e, mesmo assim, porque trata de um monólogo de divulgação, em que Jessica Tauane dá as informações necessárias para os espectadores que querem enviar vídeos para os produtores. Em todos os outros 11 vídeos analisados esse indicador foi identificado, ainda que em números menores, pois apenas um é considerado muito bom; sete bons; um razoável, e outros dois fracos. O vídeo mais bem avaliado trouxe Jessica Tauane, ao vivo pelo Hangout (plataforma de mensagens instantâneas desenvolvida pelo Google), conversando com cinco amigos justamente sobre os comentários preconceituosos recebidos pelo vídeo anteriormente citado, o Como Ser Um Bom Gay Cis – Bee Fun.

Com a intenção de rebater esses comentários e esclarecer algumas questões que não ficaram tão claras para alguns espectadores, o Canal das Bee ouve a opinião de diferentes pessoas para se construir um diálogo múltiplo e diverso. Com a mediação de Jessica Tauane, o debate conta com a participação do Arthur Santoro, uma “bixa, negra, afeminadíssima, gay, cis” (como ele mesmo se define), que não faz parte do Canal das Bee; do Renan, homem gay que também não é do canal; dos meninos do canal Transviados, Miguel e Vitor, que são homens transexuais; e do Nando, mais conhecido por Mola, um dos atores do vídeo em questão e integrante do canal.

Para entender o indicador de qualidade desconstrução de estereótipos, analisamos a forma como se deu o uso dos estereótipos no canal. Em um dos vídeos em que o estereótipo foi usado para a afirmação de paradigmas, o Menos Carão, Mais Carinho! – Pergunte Às Bee 93, exibido no dia 8 de setembro, Jessica conversa com Kawan Godoy, do canal Kawlaran, sobre os preconceitos que existem no mundo LGBT contra os gays lésbicos e os gays afeminados. Através de conceitos estereotipados das falas e dos gestos de uma mulher lésbica, houve a rotulação de um gay lésbico justamente por seu jeito e suas atitudes se assemelharem aos comportamentos pré-estabelecidos de uma mulher lésbica. Esse método, contudo, apesar de reforçar estereótipos, foi usado de forma leve e inofensiva, apenas para chamar a atenção do espectador para um grave problema que ocorre entre os gays, que é o preconceito entre eles próprios.

No indicador oportunidade, o último do plano do conteúdo, todos os 12 vídeos analisados têm boa avaliação, deixando claro, portanto, que o Canal das Bee atenta-se para a agenda midiática na abordagem e escolha de temas e convidados, focando sempre nos assuntos que tenham relevância e pertinência, para a reflexão e o debate de ideias entre os espectadores. Um exemplo do uso da oportunidade está nos vídeos exibidos no dia 22 de setembro, LAERTE | Parte 1 – Pergunte Às Bee 95 e LAERTE | Parte 2 – Pergunte Às Bee 95, em que a convidada é a artista Laerte Coutinho, cartunista, chargista, transexual e militante dos direitos LGBT’s. Abaixo podemos conferir a tabela dos indicadores da qualidade do plano de conteúdo com a avaliação de cada um deles:

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Na mensagem audiovisual, os quatro indicadores foram identificados na amostra selecionada, sendo três deles muito bem pontuados. Diálogo com/entre outras plataformas e clareza da proposta estão muito presentes em todos os vídeos; solicitação da participação ativa do púbico está muito presente em sete emissões; um pouco menos presente em três; e razoavelmente presente em dois. No indicador diálogo com/entre plataformas, avaliou-se a capacidade de interação entre diferentes tipos de plataformas e conteúdos e um exemplo dessa interação pode ser vista nos vídeos exibidos no dia 18 de setembro, Desafio De Casal – Com Mesa Para Duas E Kawlaran e Desafio De Casal – Parte 2 – Mesa Para Duas Kawlaran, em que Jessica Tauane media um desafio de perguntas e respostas com as convidadas presentes, representantes de outros dois canais do YouTube, o Mesa para Duas e o Kawlaran.

No que se refere à clareza da proposta, o Canal das Bee é objetivo, indicando sempre nos primeiros minutos de cada vídeo qual é o tema e o convidado que o espectador pode esperar depois da vinheta. No vídeo Morre, Meu! – Pergunte Às Bee 94, por exemplo, exibido no dia 15 de setembro, Débora, antes de qualquer coisa, já anuncia: “Hoje no ‘Pergunte às Bee’ a gente vai responder às perguntas que nós pedimos na fanpage do Facebook”. Ao falar isso do lado de Herbet, mesmo que esse não tenha falado nada no começo, o espectador já sabe o conteúdo do vídeo e os protagonistas, pois na única frase falada usou-se o termo “a gente” e na tela o que aparecem são duas pessoas, nesse caso, Debora Baldim e Herbet Castro.

O indicador solicitação da participação ativa do púbico também se fez presente em todos os vídeos do canal. Referindo-se aos mecanismos utilizados para estimular a participação do público, é destaque nesse indicador o vídeo Quer Aparecer No Canal Das Bee???, já mencionado acima, que traz Jessica Tauane dando todas as informações necessárias para os espectadores que querem mandar vídeos de até 2 minutos para o canal. Além desse, também é exemplo o que ocorre no vídeo Gladiadores Da Diversidade – Pergunte Às Bee 96, exibido em 29 de setembro, que trouxe Jessica Tauane entrevistando o convidado Cadu Oliveira, ativista LGBT, negro, gay, cis, e militante dos coletivos A Revolta da Lâmpada e os [SSEX BBOX]!. Com o intuito de expor os coletivos e o ato protesto contra a representação dos Gladiadores do Altar, feito por uma Igreja Universal de Fortaleza, este vídeo também solicita a participação do público através do convite que faz aos espectadores para colaborarem com o financiamento coletivo destinado à Conferência Internacional organizada pelo [SSEX BBOX]!. Além da solicitação no vídeo, o Canal das Bee também chama pela participação do público na descrição, já na primeira linha, com a frase: “AJUDE O CROWDFUNDING PARA A CONFERÊNCIA LGBTQIA DO [SSEX BBOX]!”

O último indicador do plano da mensagem audiovisual, originalidade/criatividade, não obteve números significativos na amostra analisada. A explicação está no fato de o canal não apresentar nenhum formato diferenciado ou surpreendente, ou inovar e experimentar com a linguagem audiovisual, já que possui produção simples e comunicação comuns com entrevista aos convidados, discussões e jogos de perguntas e respostas. A seguir, podemos observar a avaliação que cada indicador obteve na mensagem audiovisual:

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Com a pretensão de investigar o canal aqui exposto para identificar elementos que o caracterizassem como um canal de qualidade do YouTube, fizemos uma análise com base nos oito indicadores de qualidade definidos pelo Observatório, que permitem esse mapeamento e posterior percepção do programa/ou canal. Após o estudo, percebemos que o Canal das Bee se preocupa em gerar o riso ambíguo antecedido da reflexão, apesar de cinco emissões analisadas terem como foco o riso. Nas outras sete emissões da amostra, que trouxeram esquetes, discussões e entrevistas, o foco foi estimular o pensamento do espectador e promover o envolvimento das pessoas a cerca da aceitação da diversidade sexual e de gênero a partir da conscientização que o canal tenta promover sobre esse assunto.

Os modos de experimentação e representação do canal têm por base a temática principal, que aborda assuntos polêmicos, discriminados na sociedade e que, por isso, precisam com urgência estar em destaque e o modo como esses assuntos são tratados: sem a afirmação dos estereótipos que precisam der desconstruídos e com exemplos e fatos reais que comprovam a necessidade de se falar desses preconceitos. Trazendo novas perspectivas e diferentes pontos de vista sobre o assunto, o canal amplia o horizonte do público e aprimora as suas experiências com base na aceitação e no respeito ao próximo, o que contribui, portanto, com os elementos que caracterizam o Canal das Bee como um humorístico de qualidade.

Por Luma Perobeli.

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