Observatório da Qualidade no Audiovisual

Casseta & Planeta, Urgente!

Casseta e Planeta Urgente! foi um programa exibido pela Rede Globo de Televisão por 18 anos, entre 1992 e 2010, primeiro mensalmente, em uma faixa da programação global chamada Terça Nobre e, em 1998, conquistando episódios semanais, com duração média de 25 minutos.

Redigido e estrelado por Hubert, Cláudio Manoel, Bussunda, Hélio de laPeña, Reinaldo, Marcelo Madureira e Beto Silva, os artistas já haviam participado de programas da Globo escrevendo esquetes para Fantástico, TV Pirata e Dóris para Maiores. Antes disso, comandavam a revista Casseta Popular e o jornal Planeta Diário, periódicos humorísticos com circulação nos anos 1980.

No Plano da Expressão, o programa sempre foi composto por esquetes, sendo característica fundamental as paródias de novelas do horário nobre da Globo. Alguns quadros se mantiveram fixos por mais tempo, como a expedição Casseta Brasil Adentro e o Plantão Urgente. Mas a maior parte dos assuntos abordados era dividida entre clichês da comédia, com piadas já conhecidas e exploradas, e assuntos da agenda midiática do país.

Apesar da sátira e da construção grotesca de alguns personagens e situações, o programa se preocupava com a verossimilhança, por isso, cenários e figurinos eram muito bem produzidos e realísticos, assim como o roteiro era seguido fielmente, não permitindo improviso ou mesmo mostrando erros de gravação, características bastante comuns a programas similares.

Alguns personagens em especial marcaram os espectadores e deixaram na memória seus bordões, como o presidente Folgado Henrique Cardoso, sempre indignado: “Assim não pode! Assim não dá!”, ou a dupla de marombeiros, Maçaranduba e Montanha, com a frase “Vou dar porrada!”, usada para qualquer um que duvidasse da masculinidade deles. Gavião Bueno e seu fanatismo pelo jogador Ronaldo, Marrentinho Carioca e Os Sambabacas também estão nessa lista.

Além disso, o programa utilizava bastantes recursos gráficos inserindo animações em seus quadros, artes gráficas entre um esquete e outro ou até mesmo durante as cenas. A vinheta de abertura passou por várias modificações ao longo dos anos, mas sempre manteve a animação de uma cobra verde junto com o planeta Terra, que compunham o logotipo do programa.

No Plano do conteúdo, o indicador oportunidade foi bem avaliado devido à escolha de temas importantes abordados no programa, como violência, crise política, conflitos geopolíticos, Copa do Mundo, Pan Americano, Jogos Olímpicos, dentre outros acontecimentos paralelos às datas de exibição das emissões aqui avaliadas.

No entanto, o indicador ampliação de horizonte do público, muito dependente do anterior, não foi tão bem avaliado, pois as pautas citadas acima não são tratadas de maneira relevante, mas com ironia ou reafirmando clichês, como associar o Rio de Janeiro à violência, por exemplo. Além disso, o Casseta e Planeta, apesar das sátiras críticas, principalmente quando se trata de política, não deixa claro um posicionamento, transformando a abordagem em deboche.

O indicador desconstrução de estereótipos também não teve boa avaliação, já que o programa se baseia justamente no lugar-comum para fazer graça e utiliza comentários grotescos, trocadilhos vulgares e frases de duplo sentido em boa parte dos diálogos. Em 2003, por exemplo, o programa recebeu um manifesto do povo do Rio Grande do Sul que os acusava, entre outras coisas, de ser racista e ofensivo à honra e tradição do estado sulista. Os atores responderam que as considerações que faziam sobre gaúchos eram apenas brincadeiras e que nunca tiveram a intenção de ofender o povo daquele estado.

Já a diversidade de sujeitos representados foi considerada razoável, afinal, os personagens são de diversas etnias e gêneros, mesmo quando as mulheres são representadas por atores do sexo masculino. No entanto, a baixa classificação se deve à representação cênica de tais sujeitos, que reafirmam clichês e preconceitos.

O diálogo do quadro Plantão Urgente, do programa de 20 de junho de 2006, exemplifica bem os quatro indicadores acima citados. Na cena, um repórter vai falar sobre a polêmica do estado do Acre pertencer à Bolívia e não ao Brasil, e o fato dessa questão antiga atrapalhar assuntos políticos entre os dois países. No entanto, a oportunidade de discussão e debate se perde quando o presidente da Bolívia, descendente indígena, é representado grotescamente, além de falar em “portunhol” e ser debochado pelo repórter.

REPÓRTER: Na semana passada, o presidente da Bolívia, Pé Nuevo Morales, continuou enchendo o ‘tchaco’, radicalizou ainda mais e mandou o Brasil pra quele lugar que rima com o nome do nosso querido país. Não é mesmo, índio?
MORALES: É verdade. Nosotros somos unpuevo de los Andes, por isso estamos cagandes e andandes para el Brasil. E, no más, quiero de vueltael Acre!
REPÓRTER: Mas o senhor perdeu o lacre? Eu pensava que o sr. era espada!
MORALES:Soy espada e matador! Me refiro ao estado do Acre, que losbrasileños nos sacaram enla mano grande trocando por um cavalo. E tudo para plantar as seringueiras e depois los seringueiros, los chicos brasileños que passam lo dia inteiro sacando elleche de lo pau.
SERINGUEIRO: Não acredito que o sr. fez essa quizomba toda, arrumou essa presepada toda na geopolítica da América Latina só pra fazer, pela milionésima vez, essa piadinha de seringueiro tirando leite do pau! Ô, Lula, tu não vai fazer nada? Dá um pau nesse índio, rapá!
(Casseta e Planeta– episódio 20/06/2006).

Abaixo, o gráfico com a avaliação de cada emissão em relação ao plano do conteúdo:

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No plano da mensagem audiovisual, o Casseta e Planeta Urgente! foi muito bem avaliado no indicador clareza da proposta, considerado bom em dois episódios e muito bom nos outros três avaliados. Isso se deve à organização do programa, dividido em quadros e esquetes, à junção de todos os elementos do plano da expressão, e à fidelidade do programa ao seu lema “jornalismo-mentira e humor-verdade”, fatos que tornam claros a sua proposta.

O indicador de qualidade diálogo com/entre plataformas também obteve avaliação satisfatória em quatro dos episódios, pois o programa satiriza novelas e publicidades, além de falar de acontecimentos reais, como a Copa do Mundo, e terem participação e entrevistas com celebridades e personalidades conhecidas, trazendo verossimilhança ao programa. O que conferiu nota máxima ao episódio do dia primeiro de dezembro de 2009, nesse critério, foi, principalmente, o quadro Expedição Casseta Brasil Adentro, no qual a intenção do programa é viajar pelo Brasil mostrando as diferenças culturais que o país tem por meio de matérias especiais de comportamento e enquetes.

Já o episódio que recebeu nota razoável foi o de 20 de junho de 2006, um especial em homenagem a Bussunda, no qual não houve preocupação do programa em manter seu padrão, mas mostrar tudo o que o falecido humorista interpretou. Ademais, o Casseta e Planeta Urgente! tornou-se uma marca, com lançamento de dois filmes, oito livros, revistas e até CD’s.

Já a solicitação da participação ativa do público foi avaliada entre razoável e boa, pois há interação direta com o espectador e, em alguns episódios, um preview do próximo bloco antes do intervalo comercial. Além disso os produtos fictícios das Organizações Tabajara, além da sátira às publicidades televisivas, têm como objetivo entreter o espectador, como se fossem feitos para eles.

O indicador originalidade/criatividade não obteve notas tão relevantes quanto os outros indicadores da mensagem audiovisual, pois Casseta e Planeta Urgente! é uma reciclagem de outros programas que passaram pela Rede Globo, principalmente o TV Pirata, com suas paródias sobre a programação do canal, e o Dóris Para Maiores, do qual a principal influência foi a adoção de uma apresentadora.

Confira, abaixo, o gráfico referente a cada uma das emissões de acordo com os indicadores da mensagem audiovisual:

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Com base na análise feita é possível concluir que o Casseta e Planeta Urgente! trata-se de um programa de comédia, no qual não há preocupação com a desconstrução de conceitos arraigados.No modo de representação dos personagens e na construção de diálogos, o programa deixa a desejar quando se utiliza de tantos estereótipos, quando poderia, na verdade, desconstruí-los ou, no mínimo, amenizá-los em vez de reforça-los. Como visto, pautas atuais e relevantes foram abordadas, mas poderiam ter sido aprofundadas de forma a estimular o debate ou uma discussão sob novos pontos de vista.

Apesar de não trazer inovações quanto ao formato, o Casseta e Planeta explora muito bem os recursos audiovisuais, com roteiro bem estruturado e verossímil, e produção cênica bem elaborada. Assim como a interação com o público e a adaptação a outras plataformas, características muito claras no programa e que de certa forma trazem a ele um diferencial em relação a outras produções do gênero.

Por Lilian Delfino

Observatório da Qualidade no Audiovisual

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