O programa Furo MTV foi criado pela MTV Brasil em 2009, inspirado em um quadro do The Daily Show, com apresentação de Dani Calabresa e Bento Ribeiro, direção de Lilian Amarante e redação de Bruno Motta, Álvaro Campos e Flávia Boggio. Inicialmente teve duração de 15 minutos, mas depois passou a ser exibido por 30 minutos de segunda à sexta-feira, às 22h15. O programa é compreendido como um produto de humor que se apropria de elementos do jornalismo para desconstruí-los e, assim, formar o seu estilo.
O Furo MTV sofreu diversas oscilações ao longo de suas cinco temporadas, sendo marcado por três momentos-chave: o primeiro, que compreendeu os anos de 2009 e 2010 e que representou um período de experimentação do formato; o segundo, que durou de 2011 a 2012 e que foi seu auge e consolidação perante o público jovem, podendo ser considerado o melhor momento; e o terceiro, em 2013, que foi resultado da necessidade do programa de se reinventar devido à saída da apresentadora Dani Calabresa e da saturação do seu estilo.
O programa, que inicialmente tinha 15 minutos, alcançou grande audiência na grade da MTV e, no ano seguinte, em 2010, modificou seu tempo de duração, passando a ter 30 minutos diários. Com relação ao figurino dos apresentadores, o Furo MTV inova: Bento adota terno, gravata, bermuda e chinelo (porém estes apareceram raras vezes), enquanto Dani veste terninhos ou blusas modernas com saia e sapatilha. As externas ganharam maior espaço no último ano de programa. O novo formato, além da modificação do cenário e da abertura, alterou também os personagens principais, pois não contava mais com Dani Calabresa na bancada e passou a ser apresentado por Bento Ribeiro, Daniel Furlan, Paulinho Serra, Bruno Sutter, Pathy Dejesus e Siqueirinha, com Bento fixo na bancada, e os demais ora na bancada ora nas reportagens externas.
Para esta análise foram selecionados oito episódios que abrangessem a linha de transformação da atração. Tais emissões correspondem às seguintes datas: 2 de março de 2009 (o primeiro programa), 5 de março de 2009, 8 de abril de 2010, 20 de julho de 2010, 5 e 9 de julho de 2012, 2 de maio de 2013 e 11 de novembro de 2013.
No Plano da Expressão, observamos a semelhança do formato com os telejornais. A câmera é fixa, a visão é frontal e o enquadramento é o tradicional plano médio, porém, com modificação para desconstruir o modelo consolidado do telejornalismo. No cenário, uma bancada, um labirinto multicolorido atrás, e televisores nas laterais que mostram o tema das notícias e os nomes dos quadros. No geral, é composto por cores quentes e vibrantes, como laranja, azul e vermelho.
As falas dos apresentadores, comumente diretas com as câmeras para a transmissão da informação, são interrompidas por diálogos entre Bento e Dani e por comentários e piadas sobre os programas e artistas das outras emissoras e da própria MTV. Além disso, é frequentemente usado o recurso dos efeitos sonoros para a mudança de temas abordados.
As vinhetas do programa apresentam de forma metafórica o tema, introduzindo uma crítica. Elas mudaram de acordo com a fase do programa: em 2009, ano de estreia, a vinheta de abertura do programa era uma animação que fazia referência à disputa dos jornalistas em conseguir de forma mais rápida as melhores notícias; em 2011, era mais literal, passando a ser uma animação que trazia na tela as expressões “extra!”, “inédito”, “nooossa”, “bomba!”, “ao vivo” “nem morto”, “bizolhinha”, “excelente”, “em cores!”, “ah lá!”, “exclusivo”, “Jesus Cristo!” e “pqp!”; em 2013, seu último ano, foi uma animação que trazia uma mosca percorrendo um caminho cheio de fezes demarcadas por círculos, que levava a um globo terrestre em formato de bola plástica (nesse momento da vinheta eram mostradas quatro moscas sobrevoando o globo enquanto que outras três se encontravam caídas no chão, e em background o som da sirene de uma polícia se juntava aos zunidos dos insetos).
No Plano do Conteúdo, o indicador ampliação do horizonte do público apontou pouca contribuição para a ampliação do repertório cultural do público. Das oito emissões analisadas, apenas duas foram boas nesse quesito, cinco foram fracas e uma foi razoável. Notou-se que os pontos de vista não eram variados, apenas tinha-se a posição de Bento e Dani, os envolvidos nas notícias nunca eram ouvidos, as externas eram não eram frequentes, e os temas levantados pouco estimulavam o pensamento e o debate de ideias relevantes, pois sempre havia um gancho com celebridades (Ronaldo pular a mureta, Lady Kate é rebaixada, As alfinetadas do Ronaldo Ésper), e temas que não contribuem para a sociedade.
No indicador de qualidade diversidade de sujeitos representados o programa não se destacou muito, pois não trazia diferentes grupos sociais, nem apresentava pontos de vista diferentes dos apresentadores a respeito de um tema. Na maioria das vezes a pauta ficava no eixo Rio-São Paulo. Além disso, o programa não apresentava diversidade de gênero mesmo tendo uma apresentadora mulher. Em uma das emissões do programa, no dia 8 de abril de 2010, por exemplo, é possível ver como o Furo MTV desprestigiava mulheres. No quadro Quanto Ganha, apresentado por Bruno Motta, o repórter conversa com três comediantes, sendo uma delas mulher, e quase não dá oportunidade para ela falar, além de a ignorar. Contudo, as temáticas eram diversas e abordavam política frequentemente.
O indicador desconstrução de estereótipos não foi muito bem avaliado no programa. As representações adotadas para ridicularizar acabavam reafirmando generalizações. O programa do dia 2 de maio do último ano, por exemplo, recebeu nota mínima porque dedicou boa parte do seu tempo a ridicularizar atitudes pré-concebidas como típicas de um homossexual. Além disso, na emissão de 2 de março de 2009, ao falar de um aumento de salário dos políticos, proposto pelo então senador José Sarney, os apresentadores brincam e fazem generalizações acerca da ética dos políticos.
O indicador oportunidade foi bem pontuado por se tratar de um programa de “telejornal” e que, portanto, traz temas atuais e pertinentes no cenário nacional ou internacional como, por exemplo, as eleições de 2010. Contudo, devido à crítica aos critérios de noticiabilidade, às vezes temas sem relevância para a sociedade eram pautados e discutidos por Bento e Calabresa, como na notícia de uma jovem que forjou o próprio sequestro para não entregar o trabalho de conclusão de curso da data correta. Abaixo, o gráfico do plano do conteúdo:
Quanto à análise da Mensagem Audiovisual, no indicador diálogo com/entre plataformas podemos afirmar que o Furo tem pouca interação com outros segmentos de informação. O programa não se expandiu para as redes como vemos acontecer atualmente. Apenas durante uma temporadas eram exibidos os twitters dos apresentadores. A convergência se dava quanto aos assuntos, que eram os mesmos que em outros veículos, como jornais, telejornais e web.
Os indicadores originalidade/criatividade e clareza da proposta foram destaque. A atração ousou na abordagem e escolha dos temas, ridicularizando-os, usando bastante da paródia para isso, e apresentando notícias de um modo diferente. Era nítida a proposta de inovar, imitando, para desconstruir valores, forma e o modo de se fazer jornalismo. O programa usava os elementos do jornalismo tradicional e os modificava de modo a surpreender o espectador, como o dia em que Bento mostrou estar de camisa e samba canção, diminuindo assim a tão prezada credibilidade do jornalismo tradicional.
Na solicitação da participação ativa do público observou-se que o público tinha poucas chances de interagir nas primeiras fases do programa. O estímulo ao espectador ocorria por meio da linguagem jovem e informal adotada pelos apresentadores, ponto comum a todas as temporadas. Esse recurso gerava certa ligação entre eles já que Bento e Calabresa davam suas opiniões e contavam um sobre o outro, pareciam falar para cada telespectador. Na ultima temporada, as mudanças do programa possibilitaram maior interação do público. Foi criado um quadro para responder aos fãs do Furo e outro para que mandassem sugestões de legendas. Acredita-se que o formato de telejornal, ainda que distante do tradicional, era o que limitava a proximidade de contato. Abaixo, os indicadores de qualidade da mensagem audiovisual, com suas respectivas avaliações:
Compreendendo o Furo MTV como um produto humorístico que se apropria de elementos do jornalismo para desconstruí-los, a ficha de análise apresentou diversos aspectos que aproximam e distanciam o Furo do jornalismo moderno. Os elementos que os aproximam são: posicionamento e dinâmica dos apresentadores; iluminação do cenário; e ponto de vista, movimentação, ângulo e enquadramento de câmera. Os elementos que desconstroem o jornalismo tradicional são o figurino jovem e moderno dos apresentadores; a linguagem informal próxima do espectador; as vinhetas de animação; as artes descontraídas e irônicas que ilustram os quadros; a composição multicolorida do cenário; os efeitos sonoros, os grafismos incomuns; e o caráter opinativo dos apresentadores, que ridicularizam a imparcialidade necessária dos jornalistas.
Em vista do papel desempenhado pelo programa, é possível afirmar que ele se utiliza do estereótipo para gerar reflexão (ainda que pouca). A crítica social é quase inexistente, e a crítica política é tão ridicularizada que perde a chance de inserir nos espectadores um raciocínio que amplie o seu horizonte. Além disso, devido ao uso constante de notícias ligadas a celebridades, o programa fica sem muito espaço para abordar temas mais relevantes. Assim, podemos afirmar que o Furo MTV não é um programa majoritariamente de qualidade, mas assim pode ser considerado em algumas emissões.
Por Monalisa Lima
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