Observatório da Qualidade no Audiovisual

Samantha!

Por Larissa Oliveira

Este texto propõe uma análise da Qualidade Audiovisual, no âmbito da Criação, da série Samantha! (Netflix, 2018-2019). O conceito de Qualidade Audiovisual, aliado ao de Competência Midiática possui os eixos de: Criação, Circulação e Experiência Estética (BORGES; SIGILIANO, 2021). Para uma análise de todos os eixos seria necessária uma visão mais ampla do que a que aqui se discute. Em nosso caso, focaremos na Criação, que se desdobra no Plano de Expressão (ambientação, fotografia, edição e trilha), Plano de Conteúdo (personagens e narrativa), e Mensagem Audiovisual, que se refere à análise dos dois momentos – expressão e conteúdo – a partir de parâmetros de qualidade (oportunidade, ampliação do horizonte do público, diversidade, estereótipo e originalidade/criatividade), ou seja, condições que se voltam para a questão produtiva da série. 

Estamos diante de uma obra co-produzida pela Netflix e a produtora brasileira Los Bragas, distribuída na plataforma da Netflix. Por ser um produto de vídeo sob demanda, consegue segmentar bem o público-alvo: adultos brasileiros que viveram a infância na década de 1980 ou pessoas que consumiram produções televisivas brasileiras da década. Ainda assim, a ficção possui ideologias transnacionais (JOST, 2012), o conteúdo é possível ser assimilado por qualquer outro público, porém não se obterá a percepção de todas as referências. É dirigida e roteirizada por uma equipe de brasileiros: Luis Pinheiro, Felipe Braga, Julia Jordão, Roberto Vitorino, Patricia Corso, Rafael Lessa e Filipe Valerim, tendo Felipe Braga como showrunner. São duas temporadas disponíveis, a primeira veiculada em 2018 e a segunda em 2019, cada uma com sete episódios entre 24 e 37 minutos cada. Em entrevista ao podcast Primeiro Tratamento, a roteirista Patrícia Corso falou sobre os modos de produção da série, expôs que a primeira temporada teve seis meses de sala de roteiro, e, durante a produção, dois roteiristas estiveram no set (atípico para o meio televisivo). Cada roteiro obteve cerca de cinco a seis tratamentos e cada movimento de roteiro foi avaliado por especialistas na área, sendo assim, em questões referentes ao roteiro, a série foi bem assistida. Feito a apresentação da ficção, seguiremos a análise conforme a metodologia proposta por Borges e Sigiliano (2021).

No Plano da Expressão, há destaque pelo êxito da plataforma na realização de uma série que domina recursos para representar de maneira crítica um período caótico da televisão brasileira e os desdobramentos sociais que ela é capaz de produzir. Ambientada em um momento em que se celebrava o fim da repressão e da censura ocasionados pela ditadura civil-militar, Samantha! desencadeia situações que buscam humanizar comportamentos de ícones infantis perante as falhas sociais presentes na indústria do entretenimento, provocando o choque de comportamentos entre gerações e a depreciação ao modo de vida e de expressão sobre décadas anteriores através do riso. 

O fato da série não ser produzida por uma das tradicionais redes de tevê do país proporciona grande parte da liberdade cômica da série, além da facilidade para a inserção de convidados non-gratos pela Rede Globo de Televisão, visto que a participação de celebridades como Luciana Gimenez, Nicole Bahls e Sabrina Sato se tornam membros importantes para a criação do universo de Samantha!, que tem como responsabilidade romper os limites impostos pelas redes de televisão e sugerir sua decadência, visto que conteúdos veiculados diretamente na internet permitem maior liberdade de expressão e convergência entre as variadas plataformas existentes.

Na série, os cenários são compostos por estúdios de televisão e seus bastidores, a casa de Samantha e locações externas pela cidade de São Paulo. Ao explorar ambientes que dispõem de grande variedade de cores, em que os mesmo os cenários mais simples, como a casa de Samantha, e os estúdios de gravação ambientados no passado, Samantha! realiza com êxito a função de transportar seu telespectador para o mundo dos mais populares programas infantis do passado, criando uma relação entre a Netflix e seu público, que vê que a empresa preserva o passado audiovisual do país.

A disposição de câmeras se limita em sua maioria à utilização de planos fechados, em que há pouca mobilidade de câmera e busca sempre destacar as expressões faciais das personagens, que são muitas vezes responsáveis por indicar as situações de clímax. A introdução dos flashbacks na trama é responsável por transportar o telespectador para dentro de um típico programa de auditório dos anos 1980, transbordando sentimentos das personagens que foram mal resolvidos no passado, notado principalmente pela relação de desarmonia entre os Plimploms. A edição é veloz, em que não há a inclusão de tomadas muito longas e que promove uma narrativa ágil, cumprindo os principais interesses do público dos serviços de streaming

A trilha sonora de Samantha! consiste em canções incidentais em que se exprimem os sentimentos dos personagens assim como em toda a série, além de usufruir da receita para a criação de canções produzidas para trilhas sonoras dos programas infantis das década de 1980, sendo este um dos gêneros de maior sucesso desta primeira década. Fazendo uma alusão direta a famosos grupos infantis, como Turma do Balão Mágico e Trem da Alegria, o grupo dos Plimplons possui uma música tema que é tocada de maneira recorrente durante a trama, servindo de abertura no episódio piloto e também como toque do celular da protagonista, que é executada copiosamente, mantendo o trecho da canção fixo na mente do espectador.

Na metodologia de Borges e Sigiliano (2021), o Plano de Conteúdo se detém sobre os personagens e a narrativa da ficção. Utilizaremos as propostas de Egri (2004) para análise dos personagens e as de Newman (2006) para observar a narrativa. Em The Art of Dramatic Writing, Egri propõe o conceito de bone structure, ou uma “estrutura óssea” dos personagens, em que eles são tridimensionais, com aspectos fisiológicos, sociológicos e psicológicos. A partir destas dimensões, é possível entender a motivação do personagem em cena. Já para análise da narrativa, a escolha por Newman é porque o autor consegue em três disposições – beats, episódios e arcos, trabalhar as tramas de ficções seriadas. Comecemos pelos personagens recorrentes. 

Samantha

Samantha é uma mulher na faixa dos quarenta anos, 1.65m de altura (aparenta ser mais alta por causa do uso de sapatos de saltos), magra, pele morena, olhos castanhos, postura ereta, sempre maquiada e vestida com roupas que demarcam o corpo. Possui à classe média, é atriz e apresentadora, em 2018 uma subcelebridade, quando criança: uma estrela da televisão aberta. No trabalho, sempre se mostrou competitiva, exigente, persistente e chamando a atenção para si. É órfã, foi deixada na sede da emissora quando criança. Quando adulta, mora com os filhos e depois com o esposo, é uma dedicada mãe, amorosa e presente. Teve apenas um amigo durante a vida: Zé Cigarrinho. Seu temperamento é colérico, é comunicativa, enérgica, otimista, prática, destemida, audaciosa, irritadiça, vaidosa, sarcástica, prepotente, e possui atitude militante perante a vida. Sobre sua moralidade, é fiel aos filhos, ao casamento (mesmo que o esposo tenha passado dez anos no presídio) e à Zé Cigarrinho. Entretanto, quando criança, chegou a prender uma menina em um armário por medo do público gostar mais de sua colega, então, quando se diz respeito ao trabalho, não é uma pessoa eticamente confiável.

Dodói

Dodói é um homem na faixa dos trinta anos, baixo, negro, olhos escuros e postura ereta. Como era um jogador de futebol, costumava cuidar do corpo, mas, após sair da prisão, percebe que não está mais na mesma estética e se sente constrangido por isso, não só por ele, mas pelos times de futebol que não o querem contratar por estar mais velho e com peso acima da média do que é proposto para atletas. Diferente da esposa, Dodói não se importa em estar nos holofotes, só quer a carreira de volta para poder sustentar a família. Também de classe média, se ocupou em ser um bom jogador de futebol e esteve preso há dez anos. Além de Samantha e os filhos, tem uma mãe como membro da família. Tem como principais decepções o fato de não conseguir sustentar a família e ter ficado preso por tanto tempo. É fiel à esposa, possui problemas de vício em álcool, temperamento extrovertido e sanguíneo. 

Cindy

Cindy é a filha mais velha do casal, uma moça na faixa dos quatorze anos, negra, magra, olhos escuros e postura ereta. Também é de classe média, não possui muitos amigos, é uma filha obediente, vegana, ativista e feminista. É uma adolescente fleumática, extremamente inteligente, introvertida e se importa com as causas dos outros.

Brandon

Brandon é o filho mais novo, um menino de dez anos, branco, magro, olhos escuros e postura ereta. Também é de classe média, não possui amigos, gosta de redes sociais digitais e cultura pop, é educado e obediente aos pais. Brandon é supersticioso, tem fobias, é ambivertido, e se considera uma pessoa importante, visto que já está escrevendo sua autobiografia, aprendeu com a mãe que deveria deixar um legado no mundo. 

Figura 01 – Samantha e sua família

Fonte: Google Imagens

Alfonso / Bolota 

Alfonso é um dos integrantes da Turminha Plimplom. uando criança, era gordo, por isso Samantha o apelidou de Bolota, o que formou muito de seu âmbito psicológico. Negro, magro quando adulto (após cirurgias), cerca de quarenta e cinco anos, olhos escuros e postura ereta. É de classe média, trabalha em uma antiga locadora de filmes e discos, o que mostra o aspecto nostálgico de sua personalidade. Assim como Samantha, é uma ex-estrela mirim. É um homem frustrado pelo apelido que recebeu na infância, tem raiva da protagonista e é pessimista.

Tico

Tico é o outro integrante da Turminha Plimplom. É um adulto magro, corpo esteticamente malhado e ereto, cerca de trinta e cinco anos e olhos castanhos. Pertence à classe média, quando criança foi uma estrela, mas hoje faz trabalhos temporários em peças de teatro atuando no papel de Jesus Cristo. Foi afetado quando criança por Samantha, pois era apaixonado por ela, mas uma vez ela a fez beijar a bunda de sua boneca, desde então Tico vomita constantemente. É introvertido, melancólico e pessimista.

Figura 02 – Tico, Samantha e Alfonso

 Fonte: Samantha! (Netflix, 2018-2019)

Zé Cigarrinho

Zé Cigarrinho é a mascote do programa Turminha Plimplom. O personagem faz jus aos antigos mascotes dos programas infantis da década de 1980, como Praga e Dengue do Xou da Xuxa (Rede Globo, 1986-1992). A fantasia é de uma caixa gigante e sorridente de cigarro, objeto que era associado a uma vida de tranquila na época, tanto que tínhamos o Cigarrinhos de Chocolate ao Leite da marca Pan no Brasil. O personagem por trás da fantasia é o Zé, um senhor de idade, branco, baixo e que não está saudável. Não sabemos sobre a família de Zé, só vemos que ele tem uma relação com Samantha de amigos, quase pai, visto que foi ele que recebeu Samantha na emissora quando era neném. Zé é otimista e militante perante a vida, é ambivertido e solteiro.

Figura 03 – Zé Cigarrinho

Fonte: Google Imagens

Marcinho

Marcinho é o empresário de Samantha e Dodói, um homem branco, magro, ereto, alto, na faixa dos quarenta anos. De classe média, não parece ter família, amigos ou religião, mora numa kombi. Não possui padrões morais, é extrovertido, ambicioso, leva o estereótipo de “malandro” e faz de tudo para conseguir dinheiro. Em telefone com anunciantes, Marcinho declara ao telefone sobre Samantha e Dodói: “Propaganda de cerveja? Claro que fazem, porra. Cerveja, salsicha, remédio, cigarro, o importante é se comunicar com o jovem” (Samantha!, Episódio 01, 17’20’’); vemos assim que sua moralidade não é a esperada pela sociedade.

Liliane / Menina Cogumelo 

A Menina Cogumelo é a considerada por Samantha como rival, pois é dela a voz por trás do single da Turminha Plimplom – Abraço Infinito. É uma mulher branca, de postura ereta, com cabelo e olhos castanhos. Quando criança usava uma fantasia de cogumelo. Não é mostrado na trama sua família ou de onde ela veio, só que ela não tem amigos. É frustrada, pois nunca foi reconhecida como a voz do single e foi expulsa dos Plimploms por Samantha. Devido a esse trauma, foi internada em clínicas psiquiátricas e nunca teve uma vida saudável. Percebe-se isso no último episódio da primeira temporada, em que ela aparece de surpresa no programa revival da Turminha Plimplom:

– Menina Cogumelo: Quando eu saí dos Plimploms, eu tava um pouco desorientada, mas aí eu tive um tempinho pra refletir e é muito comum pra quem trabalha nesse tipo de coisa ter traumas psicológicos profundos, né, Samantha?

– Samantha: Não, eu não.

– Menina Cogumelo: Bom, mas não interessa os problemas. Quando eu vi, eu tava aqui de volta. E eu tou ótima! Olha só, meu cabelo. Eu tou feliz. Eu tentei suicídio, eu nunca peguei sol. E tudo isso eu tenho que agradecer a você, Samantha. (Samantha!, Episódio 07, 10’42’’)

Samantha! é uma sitcom com arco longo durante a temporada. Na percepção de Mittell (2009), um serializado episódico. Em cada episódio temos um arco delimitado, mas a trama que conduz a série é folhetinesca, envolve se Samantha voltará a ser famosa e seus questionamentos sobre o que ela está fazendo no mundo. Ao final dos episódios, temos um gancho para o próximo. Diegeticamente, a trama se passa em 2018, mas usa o recurso de volta no tempo para a década de 1980, em que Samantha se recorda da era áurea em que fazia sucesso na televisão aberta. O enredo conta a história de Samantha, uma ex-celebrididade mirim na faixa dos 40 anos, que está tentando voltar à fama. Em 1985, Samantha estrelou junto de outras duas crianças um programa chamado Turminha Plimplom, que também era um grupo musical e fez sucesso em todo o país.  A cada episódio, a protagonista enseja planos absurdos para conquistar os holofotes, ela é um elo entre a época de ouro da televisão aberta no Brasil e a ascensão de tecnologias digitais individuais, as quais Samantha não tem habilidade.

Em uma questão macro (NEWMAN, 2006), a primeira temporada corresponde a Samantha procurando atingir seu objetivo tangível: voltar a ter fama nos anos 2010 como tinha na década de 1980, com isto atingido ela se sentirá completa, plena, para ela o glamour da televisão que foi vivido na infância é o significado de felicidade. Samantha quer ser reconhecida, mas apesar de aparentar, não é uma personagem fútil, é uma boa mãe, preocupada com seus filhos, quer ser vista, mas também quer fazer disto algo bom, deseja transmitir uma mensagem de paz. Como espectadores, sabemos que atingir a fama não trará felicidade, não pelo ato da fama em si. E em um beat do último episódio da primeira temporada, a personagem cai em si e percebe isto, mas como toda boa personagem de comédia de situação, a transformação não é grande, logo, volta a querer ser famosa, mas por outros meios, de uma forma que a mensagem transmitida a seus fãs seja positiva. Na segunda temporada, o arco que guia é o de Samantha tentando mostrar a todos que cresceu, agora é uma apresentadora e atriz madura, que pode conquistar o público do teatro, mesmo que em seu coração esteja o desejo do retorno à tevê. 

No campo da oportunidade a série proporciona um resgate à memória afetiva e o repertório cultural de um público que vivenciou vícios e costumes considerados comuns no cenário brasileiro durante as décadas de 1980 e 1990, ela evidencia os desdobramentos dos fenômenos comunicacionais deste período e estimula o público a refletir sobre eles. Tratando-se de um período da existência de mídias exclusivamente analógicas como televisão, revistas e jornais, observamos a persistência de conteúdos midiáticos produzidos no passado que passam a viralizar pela internet de maneira orgânica na contemporaneidade, a aparição especial da cantora Gretchen em vários episódios demonstra bem as inspirações na expectativa de renascimento da protagonista. Ainda nesse campo, a série tem a função de criticar formatos televisivos de conteúdo nocivo que perpetuam na atualidade em todo o território nacional, sendo que muitas das situações vivenciadas pelos personagens geram desdobramentos que são aproveitados por veículos sensacionalistas da mídia, em que as muitas vezes falas das personagens são distorcidas com a função de provocar maior engajamento do público.

Nas questões que envolvem a ampliação do horizonte do público, partimos de uma série de elementos que são responsáveis por criar contradições que afetam as atitudes e condutas das personagens, invocando nos espectadores a refletir sobre a metamorfose de suas atitudes ao longo dos anos, sendo assim, atitudes que hoje são consideradas politicamente incorretas são questionadas através da ironia. Enquanto adultos que tenham maior carga cultural sobre a vivência nos anos 1980 trataram os costumes da série com maior naturalidade, as gerações mais jovens terão uma percepção diferente aos costumes dessa época, sendo classificado por esse público como o famoso “cringe”, já que a obra está repleta de momentos que exploram a vergonha alheia entre os personagens e o público. Ainda nesse plano, a série também é responsável por incitar no público a existência da humanidade de ícones que têm suas vidas expostas de maneira intensa pela mídia, sendo que seus momentos de ascensão e queda são responsáveis por condicionar veículos midiáticos que lucram a partir da glamourização e espetacularização do fracasso. A série também aponta a exploração do corpo feminino através da hipersexualização, tanto no período que remete a década de 1980, quanto no presente. No primeiro, observamos a presença de mulheres seminuas que fazem uma alusão as Chacretes, dançarinas do popular Programa do Chacrinha (Rede Globo, 1982-1988). Já nos anos 2010, Samantha protagoniza um comercial de cerveja que segue a lógica sexualização de corpos. 

A utilização de estereótipos é evidente em Samantha como a estrela decadente, Dodói como o jogador preso e Marcinho como o empresário sem escrúpulos, que fomenta o imaginário do público brasileiro sobre a vida no show business. Além disso, apontamos a ocorrência a similaridades entre Samantha e a cantora mirim Simony, integrante do grupo musical Turma do Balão Mágico, em que faz com que o público crie certas expectativas narrativas através do conhecimento da carreira da cantora, sendo este fato uma crítica a estigma da personalidade que ficou presa no tempo, não sendo digna de relevância na atualidade. O personagem Bolota traz semelhanças com o cantor Jairzinho, também integrante do grupo musical, e sua construção é baseada no estereótipo do “gordo fofo” que acaba sofrendo com piadas gordofóbicas da protagonista. Há ainda estereótipo em Dodói, que reduz ao sucesso do homem negro exclusivamente como jogador de futebol, algo que vai se transformando ao longo da narrativa devido ao personagem decidir iniciar a faculdade de direito.

Samantha! cria compromisso com a diversidade devido à escolha de um elenco que possui alta heterogeneidade étnica, social e de gênero. A série trabalha na narrativa de uma família que se distingue dos padrões impostos pela mídia, envolvendo temas como adoção, miscigenação e a trajetória de uma mãe solteira. Esses temas habituam o espectador às formas de família que compõe grande parte do público brasileiro. Por fim, no quesito originalidade/criatividade, o fator nostalgias tem função importante no diálogo entre os costumes manifestados na obra e a agenda midiática do público. A ficção tira o eixo dos estudos de nostalgias apenas como uma visão romântica do passado e nos coloca em uma posição satírica em relação aos anos 1980 (OLIVEIRA, 2021).

Podemos concluir que a obra é um marco na Netflix por ser a primeira série de comédia brasileira da distribuidora. É perspicaz na abordagem satírica sobre a história da nossa televisão, principalmente nos icônicos anos 1980, quando a democracia foi restaurada no país. Acreditamos que Samantha! é uma obra que segue vários parâmetros de qualidade no audiovisual como diversidade, ampliação do horizonte do público, oportunidade e originalidade, como discorremos, entretanto, é interessante observar o jogo feito com os estereótipos e até que ponto seria interessante reforça-los.  

Referências

BORGES, Gabriela. SIGILIANO, Daiana. Qualidade Audiovisual e Competência Midiática: proposta teórico-metodológica de análise de séries ficcionais. In: XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo – SP, 27 a 30 de julho de 2021. Disponível em: <https://bit.ly/3Bb8OsL>. Acesso em: 14 nov. 2021. 

EGRI, Lajos. The Art of Dramatic Writing: Its Basis in the Creative Interpretation of Human Motives. New York: Touchstone, 2004.

JOST, François. Do que as séries americanas são sintomas? Tradução de Elizabeth B. Duarte e Vanessa Curvello. Porto Alegre: Sulina, 2012. 

MITTELL, Jason. Television and American Culture. UK: Oxford University Press, 2009.

NEWMAN, Michael Z. From Beats to Arcs: Towards a Poetics of Television Narrative. The Velvet Light Trap, University of Texas Press, n. 58, p. 16-28, 2006. Disponível em: <http://my.fit.edu/~lperdiga/HUM%2030850-Television%20and%20Popular%20Culture–Newman.pdf>. Acesso em: 03 jul. 2020.


OLIVEIRA, Larissa. Gestos nostálgicos na televisão brasileira: a representação dos
programas infantis dos anos 1980 em Samantha! e Verão 90. 148 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação e Culturas Midiáticas), Universidade Federal da Paraíba – UFPB, Paraíba, 2021.

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