O canal O Que Tem Pra Hoje, criado em agosto de 2011 é, segundo as descrições dos vídeos, “um canal de esquetes (vídeos engraçados, de humor), independente.”. Em maio de 2016 contava com cerca de 130.000 inscritos, 92 vídeos e mais de 20.000.000 visualizações.Entretanto, as emissões analisadas do canal – todas de setembro de 2015 – fazem parte de uma websérie produzida pela Toca dos Filmes: Os Britos Também Amam. Nela, é apresentado Rafael Brito, um homem de 32 anos que leva uma vida semelhante à de um adolescente, juntamente com seus dois amigos, Chelo e Rico. Brito é procurado por Kelly, sua ex-namorada de 15 anos atrás, que revela que ele tem uma filha adolescente chamada Raquel. Ele, então, passa a ter novas responsabilidades que o levam ao temido amadurecimento.
No plano da expressão se destaca a produção do programa, de alta qualidade. O cenário, por exemplo, é bem montado e o figurino bem planejado. Os equipamentos utilizados para filmagem e iluminação também conferem destaque à produção, dando qualidade à série. Tais características fazem lembrar as produções televisivas. O projeto foi financiado através do Catarse, uma plataforma online de financiamento coletivo, que permitiu a realização da série com tal qualidade.
No plano do conteúdo, o indicador diversidade de sujeitos representados foi pontuado de forma razoável em todas as emissões. Há certa diversidade de gênero e pontos de vista, visto que se tem a representação de uma mulher séria e correta, uma adolescente e um homem despreocupado e sem responsabilidades, por exemplo. Entretanto, faltam personagens que deem diversidade socioeconômica, cultural, étnica, dentre outros. Não há grande pluralidade dentre os sujeitos representados, motivo pelo qual o indicador foi considerado razoável na análise.
O indicador oportunidade foi igualmente avaliado. O tema tratado pela websérie – a descoberta da paternidade, o amadurecimento e o cuidado com os filhos – pode ser encontrado comumente em outras séries ou novelas, por exemplo. Essa situação também faz parte do cotidiano de algumas famílias, estando, portanto, presente nas agendas da mídia e do público, em maior ou menor quantidade. Contudo, esse tema não é pauta constante ou rotineira nessas agendas, motivo pelo qual a avaliação não foi maior.
Em relação à ampliação do horizonte do público, o episódio 13 da websérie recebeu avaliação razoável, já que, assim como todos os capítulos em geral, trata da figura do pai, em especial da descoberta da paternidade, questão pertinente e que pode levar os espectadores à reflexão sobre o tema. Tem-se como exemplo o diálogo entre Brito e Raquel:
RAQUEL: Não, por que você tá defendendo a minha mãe?
BRITO: Eu não tô defendendo a sua mãe.
RAQUEL: Ela é uma pentelha!
BRITO: Para de falar, boca suja.
RAQUEL: Eu falo como eu quiser, quem é você pra mandar em mim?
BRITO: Eu… Eu sou seu pai.
(Os Britos Também Amam – Episódio 13)
Já os episódios 12(01/09/2015) e 14 (08/09/2015)receberam avaliação boa. O primeiro, por tratar, além do assunto geral da série, da gravidez na adolescência e dos papéis conjuntos da mãe e do pai. O diálogo entre Kelly e Brito exemplifica isso:
KELLY: Eu te falei pra não deixar aquele moleque dormir aqui!
BRITO: Kelly, eu fiquei fora do esquema por 15 anos, me deixa sair como o pai gente fina, vai.
KELLY: E eu como a mãe megera.
BRITO: Que bom, achei que você não ia topar!
KELLY: Não vou!
(Os Britos Também Amam – Episódio 12)
Já o episódio 14 recebeu tal avaliação por enfatizar a importância do papel paterno, como visto no diálogo entre Brito e seus vizinhos Rico e Chelo, os quais questionavam se Brito seria realmente o pai de Raquel. Brito responde: “Vocês dois são uns imbecis. Eu sou o pai dela. Por bem ou por mal, se eu peguei no meio do caminho, dane-se. A partir de agora eu vou fazer de tudo pra ser uma boa pessoa pra ela. Vocês entenderam?”. Essas questões abordadas durante as emissões são férteis e têm a capacidade de promover o debate de ideias, incrementando o indicador.
No episódio 12, o diálogo entre Brito e Kelly, que aborda o papel do pai “gente fina” e da mãe “megera”, foi o motivo pelo qual tal emissão recebeu avaliação fraca no indicador desconstrução de estereótipos. O diálogo aborda os estereótipos representados por esses papeis sem, contudo, desconstruí-los, o que justifica a avaliação fraca no indicador.
O episódio 14, por sua vez, é construído sobre a dúvida a respeito da paternidade de Brito, uma vez que Chelo e Rico, ao descobrirem que o amigo não se lembra da “concepção” da filha, questionam se ele é realmente pai de Raquel. Brito, ao contrário do que é esperado, não leva o questionamento adiante, mesmo sendo incentivado pelos amigos. Chelo chega a pegar a garrafa de água de Raquel e a entrega para Brito fazer um teste de DNA, mas Brito joga a garrafa fora. Ao contrário do que comumente se espera de um homem sem responsabilidades e imaturo como Brito, ele assume a paternidade sem questionamentos e tenta ser um bom pai, como exemplificado anteriormente durante o diálogo dele com seus vizinhos. Por esse motivo, o episódio 14 recebeu avaliação boa no indicador desconstrução de estereótipos. Abaixo, as avaliações de cada emissão:
No que diz respeito à mensagem audiovisual, o indicador clareza da proposta foi muito bem pontuado em todas as emissões analisadas, pois o objetivo da série não deixa dúvidas e o que foi proposto é apresentado de forma clara.
Quanto à originalidade/criatividade, a websérie recebeu avaliação razoável, pois não traz grandes inovações. O conflito principal proposto não se diferencia muito de temáticas já expostas em outras produções, assim como não há grande experimentação na forma dos vídeos.
O não teve destaque nas avaliações, sendo pontuado de forma razoável. O que incrementou o indicador foram as semelhanças com as produções televisivas e a posterior transformação da websérie em DVD pela Toca dos Filmes.
O indicador de qualidade solicitação da participação ativa do público também não foi destaque. Poucos recursos são utilizados para uma comunicação mais estreita com a audiência ou para estimular dela uma participação ativa. A linguagem é um ponto que aproxima os personagens do público, uma vez que se assemelha muito àquela utilizada no dia-a-dia. Como exemplo, tem-se o episódio 13 da websérie (04/09/2015), no qual Chelo conversa com Brito:
BRITO: Chelo, alguma vez eu falei mal da Kelly?
CHELO: Tirando ontem à noite?
BRITO: Eu não falei nada ontem à noite.
CHELO: Disse que ela era uma megera e que merecia levar uma surra de jabá.
(Os Britos Também Amam – Episódio 1304/09/2015)
Há também um link no início do vídeo, escrito “pular abertura”, que leva ao final da vinheta inicial e representa uma solicitação da participação do público. Porém, esses são uns dos poucos recursos que incrementam o indicador e não possuem destaque na produção. Veja, abaixo, os indicadores de qualidade de cada episódio e as suas respectivas avaliações na mensagem audiovisual:
A partir da análise, pôde-se verificar que o canal O Que Tem Pra Hoje, a partir das emissões estudadas da websérie, obteve avaliações consideráveis em indicadores essenciais à qualidade do humor, como ampliação do horizonte do público e desconstrução de estereótipos. Sendo assim, podem-se observar certas características de qualidade na websérie, entretanto tais características não possuem, geralmente, muito destaque dentro da produção.
Por Júlia Garcia Gouvêa Andrade
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