Observatório da Qualidade no Audiovisual

Um Menino Muito Maluquinho

Uma obra que encantou crianças e adultos, Um Menino Muito Maluquinho foi uma série de TV brasileira produzida e exibida pela TVE. Baseada nas obras infantis do escritor Ziraldo, a atração conta a história do Menino Maluquinho, um garoto brincalhão, cercado de amigos, com uma imaginação extremamente fértil e um faro para novas aventuras e maluquices. A história é narrada pela versão de 30 anos de idade do Menino Maluquinho, relembrando suas aventuras de quando tinha 5 e 10 anos, respectivamente. O personagem também já foi adaptado para o cinema 1995, com a direção de Helvécio Ratton.

Apesar de possuir apenas uma temporada, a série fez tanto sucesso que o canal de TV fechada Disney Channel a incluiu em sua grade de programação, de segunda a sexta-feira, ao meio dia. Na TVE, produtora do programa, sua exibição era feita aos domingos, às 18h30, e reprisados nas sextas-feiras em dois horários, 11h30 e às 14h. A trama também foi exibida pelo canal TV Cultura todas as sextas-feiras, às 14h, com reprises às quintas-feiras na parte da manhã. Depois de um período longe das TVs, a série voltou a ser exibida pelo canal TV Brasil de 2011 a 2013 e na TV Escola de 2013 a 2014. Sua última transmissão foi em fevereiro de 2018 pela TV Câmara de São José do Rio Preto, quando deu lugar ao programa Inclusão, focado em pessoas com deficiência, após um período de exibição de 3 anos pelo canal.

Um Menino Muito Maluquinho foi produzida pela Governo Federal, com apoio da Secretaria de Educação a Distância, Ministério da Educação, Secretaria de Audiovisual, Ministério da Cultura, Fundo Nacional de Cultura, com patrocínio da Petrobras e da Lei de Incentivo à Cultura da Agência Nacional de Cinema (ANCINE). A série ganhou três prêmios, tendo sido indicada cinco vezes. Dessas cinco indicações, três foram em premiações internacionais, vencendo em uma delas.

Os cenários principais se baseiam na casa de Maluquinho, focando mais na sala, na cozinha e em seu quarto. Na escola, os locais que mais aparecem são sala de aula e o pátio onde as crianças brincam. Entretanto, a história não fica somente presa estes espaços. Em outros episódios podemos observar a casa dos amigos de Maluquinho, o zoológico, o campinho do bairro, e mais outros locais que completam a narrativa. O quarto de Maluquinho reflete bem sua personalidade, tanto com 5, quanto com 10 anos. O ambiente é repleto de brinquedos de diversos estilos, na maioria das vezes bem bagunçado, mas também com muitos livros e materiais para leitura, que reflete na curiosidade do personagem por descobrir coisas novas.

Os figurinos dos personagens são roupas simples, comuns do dia-a-dia, com exceção da panela que Maluquinho usa na cabeça e que é um dos grandes mistérios da série. Apesar de muitas especulações sobre como ele recebeu esse apelido e como começou a suar a panela na cabeça, esse questionamento não é respondido na série, pois nem Maluquinho, nem os adultos, sabem ao certo a verdadeira história da panela na cabeça. Outra lacuna informacional deixada na trama é o verdadeiro nome do personagem, que em todos os episódios é chamada apenas do pelo apelido.

A trilha sonora consiste na música de abertura ‘Festa do Menino Maluquinho’ de Antonio Pinto, além de músicas instrumentais que compõem e ajudam a contar a história.

A fotografia é naturalista, explorando bastante a luz natural. É explorado com bastante frequência um plano aberto nos episódios, mostrando bem a localidade dos personagens, com movimentações de câmera que dão visibilidade quase completa dos cenários.

Apesar dos episódios seguirem uma ordem cronológica linear, onde o espectador sabe perfeitamente em que época cada Maluquinho se encontra, o último episódio da série apresenta uma narrativa completamente diferente das demais. Ele é focado em Maluquinho com 30 anos vendendo a casa de praia de seus pais. É a primeira vez que o personagem com essa idade aparece fora da narração da série. A história mostra o encontro entre os três Maluquinhos, numa alusão ao passado, presente e o futuro, onde os três personagens se encontram na praia e começam a conversar sobre as coisas da vida. Nesse episódio não só os Maluquinhos se cruzam, como todos os personagens interagem entre si, fazendo a linha do tempo das histórias se fundir, não existindo uma linearidade cronológica.

A narrativa se aproxima dos espectadores apresentando acontecimentos cotidianos da rotina uma criança de 5 e 10 anos de idade como, por exemplo, a necessidade de brincar, as primeiras descobertas, as frustrações de notas baixas, os primeiros amores, os famosos “porquês” de tudo. Nesse sentido, o personagem principal é construído de forma que se aproxima do público intimamente, criando uma identificação com quem assiste a série. Os episódios independem uns dos outros, cada um possui seu arco que é concluído sempre no final, mas que compartilham o mesmo universo ficcional. Além disso, os personagens conversam diretamente com o público, em comentários realizados no meio dos episódios, complementando o que está se passando nas cenas.

Os episódios possuem até no máximo meia hora de duração e começam geralmente com Maluquinho nos seus 30 anos relembrando alguma situação vivida. Esse início não é regra para todos os episódios, em alguns deles a narrativa é diferente, já mostrando a situação vivenciada pelo personagem principal, seguida dos comentários do personagem nas diferentes faixas etárias. Como os episódios são construídos em diferentes linhas do tempo, eles não possuem uma ordem certa para qual época vai se iniciar a narrativa, mas uma vai dando espaço a outra se complementando, mostrando situações parecidas que acontecem com Maluquinho em seu 5 e 10 anos. Os episódios sempre se fecham, ou seja, os acontecimentos ocorridos são sempre resolvidos no mesmo, não avançando para outros episódios.

Há recursos gráficos que dão vida a imaginação do menino, como no episódio que ensina sobre consumismo, onde a mãe de Maluquinho explica que dinheiro não nasce em árvore e logo em seguida aparece uma animação de uma pessoa plantando dinheiro e nascendo uma árvore. Esse tipo de recurso aparece em quase todos os episódios e possuem diferentes formas, podem ser colagens dos personagens, desenhos que misturam os personagens as suas fantasias. Estes recursos estimulam a imaginação do público, dando vida aos pensamentos mais criativos do menino, tornando-os visíveis.

A série introduz diálogos sobre padrões sociais de forma simples, como no episódio “Bonito, Feio”, onde Maluquinho, seu amigo Bocão e seu avô vão até o zoológico. As crianças começam a discordar sobre quais animais são “bonitos” ou “feios”, mas, logo em seguida, o avô de Maluquinho explica para as crianças que esses conceitos são relativos, o que pode ser bonito para um, pode não ser para outro e vice e versa, e que isso não exclui a opinião do outro sobre algo. A princípio, o episódio mostra Maluquinho com 5 anos de idade no zoológico com seu amigo e seu avô, discutindo sobre o assunto, mas ele se estende para Maluquinho com 10 anos, quando Bianca, uma menina nova, chega ao colégio e todos os meninos se encantam, inclusive o protagonista. Apesar de todos os seus esforços para se aproximar, a menina o chama de feio, fazendo-o entrar em uma tristeza profunda e começar a entender, a partir de uma conversa com sua amiga Julieta, que a opinião de Bianca não é a mesma de outras pessoas.

Os adultos possuem participação efetiva na série. Tanto pela versão de Maluquinho com 30 anos, que narra suas lembranças, quanto pelos pais do protagonista, que sempre o ajudam e apoiam em todos os momentos. O seu avô, Sr. Hotêncio, também tem participação importante na trama, sendo um personagem super alegre e que ensina Maluquinho a sempre olhar o mundo através de novas perspectivas. A professora Paula que incentiva seus alunos a buscarem conhecimento de formas sempre criativas e, também, Dona Irene, personagem constante na linha do tempo onde o garoto tinha 5 anos e que sempre acoberta Maluquinho em suas aventuras pela casa. Na parte das crianças, os principais amigos de Maluquinho são Julieta, uma menina inteligente e esperta, que ajuda o protagonista em suas aventuras e que também é o par romântico do personagem, e Bocão, um menino meio atrapalhado, mas muito inteligente e sempre fiel ao Maluquinho. As três crianças se conhecem desde os 5 anos de idade e estudam juntos.

No episódio ‘Azul, Rosa’ mostra como a série se mostrou inovadora e disposta a apresentar discussões relevantes. A narrativa do episódio é marcada pelo debate da sexualidade e as definições convencionais de “coisas de menino” e “coisas de menina”. Na escola de Maluquinho, os meninos e as meninas se separam, alegando que meninas não podem fazer as mesmas coisas que os meninos e vice e versa. No decorrer da trama, Maluquinho e Julieta fazem um plano para que os grupinhos voltem a conversar e pararem com a divisão. Esse episódio traz o debate das construções de gênero dentro da nossa sociedade e o desconstrói de maneira simples, quando meninos e meninas se juntam no final, entendendo que a separação por gênero é algo antiquado e desnecessário. Debate este que ocorre também na época em que Maluquinho tinha 5 anos, em que a professora ensina aos alunos como o processo de reprodução e a importância do macho e da fêmea para a vida.

A série apresenta um elemento inovador de quebra da quarta parede, ou seja, os personagens olham diretamente para câmera em certo ponto, conversando com o espectador. Os personagens comentam as situações que estão acontecendo no momento por meio das interrupções no meio da narrativa. Essas quebras são feitas pela maioria dos personagens, desde as crianças até os adultos.

Animated GIF - Find & Share on GIPHY

Apesar de ser baseada em histórias em quadrinhos, livros e filmes, a série não possui nenhuma ação transmídia ou que promova a participação do público.

 

Por Pedro Martins

Ficha Técnica:

  • Criadores: Anna Muylaert, Cao Hamburguer
  • Diretor: César Rodrigues
  • Exibição: 19 de março a 10 de julho de 2006
  • Temporadas: 1 temporada
  • Número de episódios: 26 episódios
  • Duração: Entre 22 e 28 minutos

Observatório da Qualidade no Audiovisual

Comentar